Por Rui Lourido, historiador, presidente do Observatório da China
Assistimos atualmente a uma elevada turbulência política e ao desencadear de conflitos de elevadíssima violência em vários continentes. A Ocidente, utiliza-se a expansão agressiva da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) para Oriente com o pretexto da defesa da liberdade, dos direitos humanos e da democracia, omitindo que a democracia e os direitos humanos não são propriedade do Ocidente. A Oriente, o argumento é a defesa dos direitos de minorias étnicas russófilas e de proteção das suas fronteiras. A China aparece como a nação mais ponderada, não projetando forças militares para fora das suas fronteiras e tomando a iniciativa, junto da comunidade internacional, em especial da Organização das Nações Unidas, de propor várias iniciativas globais com ênfase no desenvolvimento e na segurança. As propostas chinesas procuram, por um lado, promover o desenvolvimento económico e social, através da circulação de bens e de pessoas, no respeito pelas redes de redistribuição internacional, como base para a satisfação das necessidades de melhoria do nível de vida das respetivas populações e, por outro lado, visam reforçar a segurança comum, abrangente, cooperativa e sustentável. Os países são chamados à responsabilidade de construir consensos através do diálogo e da cooperação, e desenvolver mecanismos de governação abertos, justos e eficientes para beneficiar a humanidade e contribuir para a construção de uma comunidade de futuro compartilhado para a humanidade.
A postura dialogante e prudente da China tem criado condições ao desenvolvimento e promoção da visibilidade do Sul Global. Neste contexto, o Brics com 10 países membros é considerado como uma esperança para o relacionamento mais justo e pacífico, em nível internacional, que possa conter a ameaça da hegemonia dos Estados Unidos.
Cada vez mais países do Sul Global, onde se destacam o Brasil e a África do Sul, denunciam a dualidade de critérios das elites do Ocidente. Afirmam que a “Ordem internacional baseada em regras”, difundida pelos EUA e parte da elite ocidental, é uma falácia. Apresentam como indício, o continuado apoio político (impedindo a aprovação, nas Nações Unidas, de moções a obrigar Israel ao cessar fogo na Faixa de Gaza) e militar a Israel (através da entrega sucessiva de armas e do posicionamento de milhares de soldados em porta-aviões e submarinos junto a Israel). O genocídio (provocado pela guerra e pela fome) perpetrado contra os Palestinianos, desde há 4 meses, poderia ser impedido se os EUA, em vez de “belas” e contraditórias declarações, utilizassem alguns soldados para forçar a entrada de camiões com alimentos e o fim da guerra na Faixa de Gaza.
O sucesso do regime de democracia popular socialista, com características chinesas, tem permitido à China ter um crescimento médio anual estável. Desde 2012, com o 18º Congresso Nacional do Partido Comunista da China (PCCh), o processo de democracia popular foi reforçado como um conceito-chave, orientador do Estado de Direito, e desenvolvido através de medidas objetivas, aplicadas por instituições relevantes e com ações concretas e eficazes, como a erradicação da pobreza extrema e a construção de uma sociedade com um desenvolvimento mais elevado, que permita a todos, pelo menos, um rendimento médio. A China abriu-se cada dia mais ao mundo e a sua proposta de criação conjunta da Iniciativa Cinturão e Rota (ICR: redes de circulação mundial com os países da Ásia, África, Europa e América) promove o respeito mútuo, a inclusão, o intercâmbio e a aprendizagem entre várias civilizações e países. A ICR encarna, simultaneamente, o princípio democrático de ganho mútuo, da consulta e negociação; e o princípio da promoção e proteção dos direitos humanos e da democracia (cuja validação internacional não pode ser determinada só por um ou alguns países). A construção cooperativa da ICR respeita plenamente a soberania, a segurança, os interesses de desenvolvimento e as tradições culturais de todas as nações.
Devido ao papel relevante da China no mundo de hoje e ao seu rápido desenvolvimento económico, científico e tecnológico, assistimos à enorme campanha Ocidental, conduzida pelos EUA, de tentar impedir o desenvolvimento da China, através da guerra comercial, política e da manipulação da informação. O incentivo à independência da província chinesa de Taiwan é outra tentativa de fragilizar a China. Os EUA aprovaram uma orientação estratégica de segurança nacional, que não esconde a agressão militar como seu último recurso, caso não consigam travar o desenvolvimento da China. Através de fakenews tentam apresentar a República Popular da China como uma ameaça para a democracia e em especial para a Europa e para o Ocidente. O controle, quase total, dos grandes meios de comunicação digital no Ocidente, pelos grandes grupos oligárquicos capitalistas, impossibilitam o esclarecimento e a apresentação da realidade chinesa, e ocultam o facto de que são os EUA que possuem mais de 800 bases militares no exterior na tentativa de continuar a garantir a sua hegemonia sobre os outros países.
O Ocidente tenta fazer esquecer que o regime político chinês é uma democracia popular socialista de características chinesas e o seu sistema representativo está de acordo com o artigo 21.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos. O regime político chinês estabelece um Estado de Direito com os três poderes: legislativo, executivo e judicial. É um sistema político híbrido baseado no Sistema de Cooperação Multipartidária de Consulta Política, nascido no processo de construção da República Popular da China, em 1949, e é baseado em Assembleias Populares com elevada participação popular, em todos os níveis administrativos (do local ao regional e nacional).
A democracia é um processo concreto em constante evolução e de melhoria das condições de vida da generalidade da população. Enraizada na história, na cultura e na tradição, assume diversas formas (nenhum país pode reclamar a sua propriedade) e desenvolve-se ao longo dos caminhos escolhidos pelos diferentes países com base na sua história, experiência e inovação. A democracia de um país só pode ser avaliada e reconhecida pela comunidade internacional e não decidida, arbitrariamente, por alguns países/juízes autonomeados.
O Partido Comunista da China, como partido no poder, é o responsável pela implementação do socialismo com características chinesas. É um sistema democrático, onde a Assembleia Popular Nacional (APN) é o órgão legislativo do poder estatal, no qual estão representados os oito partidos políticos, as regiões autónomas e os grupos étnicos minoritários, além de representantes de todas as forças sociais (incluindo federações empresariais) e entidades científicas. A Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CCPPCh) é o principal órgão consultivo político do país que estuda e apresenta propostas de alteração à legislação em discussão para serem aprovadas pela APN. O PCCh promoveu várias revisões constitucionais, que permitiram reforçar o papel do Estado de Direito e das instituições democráticas chinesas.
De destacar que este ano se comemoram o 70.º aniversário do estabelecimento da APN e o 75.º da criação da CCPPCh, cujas reuniões se realizaram no início de março, em Beijing (com cerca de 3 mil representantes da APN e mais de 2 mil membros da CCPPCh).
A democracia popular do regime político chinês pode ser observada, nomeadamente, pela redução da pobreza extrema, pelo rápido crescimento da classe média e da melhoria de vida da população chinesa e pelo aumento exponencial do acesso ao ensino superior, à ciência e às novas tecnologias (como a maior e mais avançada rede 5G do mundo).