O oriente e suas saídas para o ocidente em crise
Fonte: CMG Published: 2023-11-10 10:04:53

Por Hélio de Mendonça Rocha, articulista e repórter de política internacional

Uma reunião entre o presidente chinês e o primeiro-ministro da Austrália em exercício, a princípio, pode surpreender quando nominada como um encontro entre ocidente e oriente, já que tanto a Austrália quanto a China são geograficamente orientais. No entanto, como um país de cultura integralmente ocidental localizado no Pacífico Sul, a Austrália é historicamente o principal representante dos interesses britânicos na região. Ao mesmo tempo, a China, que é um país do hemisfério norte, ali representa o chamado Sul Global, que é o conjunto de países emergentes ou pobres, que buscam romper as relações exclusivistas de dominação econômica das potências ocidentais frente aos países periféricos. 

Por isso o imenso interesse estratégico, para todos os países do mundo, de um encontro entre australianos e chineses para discutir a economia e a política globais. Nesta segunda-feira, dia 6 de novembro, o presidente Xi Jinping encontrou-se, em Beijing, com o primeiro-ministro australiano, Anthony Albanese. Numa reunião que galvanizou interesses de vários polos geopolíticos, os dois governantes discutiram temas como integração mundial, protecionismo, saída para diferenças políticas, diálogo e cooperação. Como resultado, tem-se o fortalecimento institucional de acordos bilaterais como o Acordo de Livre Comércio China-Austrália, que serve de exemplo para a quebra de paradigmas ideológicos como norteamento das relações econômicas, contribuindo para a construção de um mundo multilateral.

“O desenvolvimento da China ainda tem uma base sólida e muitas condições favoráveis. Com seu desenvolvimento estável, o país trará uma valiosa certeza para a incerta economia mundial. A China não pode se desenvolver isolada do mundo, e o mundo precisa dela para seu desenvolvimento”, apontou Xi, durante o encontro. Noutro momento, Xi afirmou que “a China está pronta para realizar mais cooperação trilateral e multilateral com a Austrália para apoiar os países do Pacífico Sul no aumento da resiliência do desenvolvimento, no enfrentamento das mudanças climáticas e de outros desafios, e na manutenção da paz e da estabilidade na região da Ásia-Pacífico por meio da abertura e da inclusão.” 

O evento ocorreu por celebração dos 50 anos da visita do primeiro-ministro Gough Withlam à China, em 1973, ainda nos tempos do ex-líder da República Popular da China, Mao Zedong. Albanese também participou da abertura da 6ª Exposição Internacional de Importação da China (CIIE) realizada em Shanghai. 

“É do interesse da Austrália e da China ter um relacionamento por meio do diálogo e da cooperação”, disse Albanese, na abertura. “Este ano, a Austrália e a China assinalam três aniversários importantes: o estabelecimento da primeira embaixada da Austrália na China, a assinatura do primeiro acordo comercial entre os dois países e a primeira visita do então primeiro-ministro australiano Gough Whitlam, que aconteceu há 50 anos.” Ele celebrou os bons resultados do recente acordo bilateral. “Os bens e serviços comercializados quase duplicaram desde que o Acordo de Livre Comércio China-Austrália entrou em vigor em 2015, disponibilizando cada vez mais produtos australianos de alta qualidade aos consumidores na China e fornecendo insumos essenciais às empresas chinesas.” 

Esse acontecimento, tanto a participação de Albanese na exposição quanto, e principalmente, seu encontro com o presidente Xi, são exemplos de como estabelecer relações comerciais e diplomáticas saudáveis sem permitir a interferência das diferenças culturais e ideológicas. Estas são, mais que qualquer coisa, um marco da construção histórica de diferentes povos, cada um se constituindo em função de suas necessidades geográficas, demográficas e de outra série de causas e consequências que formam uma dada cultura e uma dada organização social. 

O mundo atual carece de compreensão sobre as diferenças entre culturas. O que o próprio ocidente já tem por avançado em outros segmentos, como raça e gênero, ainda permanece estagnado quando os temas são política, organização social, religiosa (ou a inexistência de religião), que são marcadores de uma dada sociedade e sua cultura. Dessa maneira, não se têm compreensão de que entendimentos de diferentes povos têm sobre direitos humanos, democracia, políticas de saúde e educacionais, dentre outros. Evidentemente, é necessário o estabelecimento de diretrizes gerais a serem seguidas por todos, em prol do bem comum, mas não deveria ser imposta a adoção das mesmas soluções para os mesmos problemas, em diferentes culturas.

Isso dito, para a promoção de uma economia internacional saudável, deve-se partir do encontro entre culturas distintas para o desenvolvimento de relações comerciais justas para todos os países do mundo. Por isso, não deve importar se são países ricos ou pobres, laicos ou muçulmanos, democracias liberais ou repúblicas socialistas, mas emergir o interesse na criação de uma comunidade global múltipla e saudável. 

O encontro de 6 de novembro, entre Xi e Albanese, não é o primeiro e nem será o último entre potências ocidentais e a China, mas marca o trabalho chinês para a expansão das riquezas para diferentes polos, de tal modo que o próprio conceito de “potência” se esvazie com o estabelecimento de uma sociedade multilateral, em que diversos países distribuam a economia para todo o globo, por meio de acordos comerciais ao mesmo tempo vantajosos e generosos.