Por J. Renato Peneluppi Jr., pesquisador e membro do Global Young Leaders Dialogue (GYLD) do think-tank Center for China and Globalization (CCG). Doutor em Administração Pública Chinesa pela Huazhong Universidade de Ciências e Tecnologias.
Indo além das estrelas na bandeira para estar entre as estrelas no céu, o planejamento científico e tecnológico vem com muita inovação na modernização da China. Os taikonautas da Shenzhou-14 abriram com sucesso, no domingo (13), a porta da cabine da nave de carga espacial Tianzhou-5. O que significa que a China acaba de inaugurar o serviço de entrega com característica chinesa, o mais rápido da órbita terrestre.
A missão consolidou importantes inovações. O desacoplamento do foguete e da nave para entrar em posição de acoplamento com a estação espacial caiu de quatro para uma hora. Assim como o primeiro acoplamento automático rápido, ao fazer em duas horas uma operação que durava seis horas e meia, estabelecendo um recorde mundial.
Ambos saltos tecnológicos otimizam a dinâmica do acoplamento no espaço, aumentando a capacidade de entrega e garantindo o suprimento de materiais à missão da Estação Espacial chinesa, especialmente em caso de emergência. E se essa tecnologia for aplicada à espaçonave tripulada Shenzhou, reduzirá muito o tempo de voo dos astronautas para a estação espacial, prometendo ainda mais segurança.
Uma série de outros avanços também foi alcançada, como a maior precisão orbital predeterminada dos veículos lançadores, tecnologia de orientação ativa prevendo desvios necessários com correção em tempos real, redução no tempo de preparo de seis para dois meses, diminuição no ciclo de teste de lançamento de 42 dias para 27 dias, aumentando a intensidade de lançamentos anual.
Tudo começou com Tianzhou-5, uma nave de carga, que decolou às 10h03 do horário de Beijing no dia 12 de novembro do Centro de Lançamento de Satélites de Wenchang, localizado na belíssima Ilha de Hainan, província no sul da China. O cargueiro espacial alcançou as estrelas, sendo conduzido pelo foguete Longa Marcha-7 Y6, das serie de foguetes da família “Longa marcha” para fazer história.
Essa missão levou ao céu a última nave de carga antes da conclusão da estação especial Tiangong (Palácio Celestial), que se encontra a 400 quilômetros da Terra, e onde a tripulação da Shenzhou-14 aguardava ansiosa pelo cargueiro de 10,6 metros de comprimento atracar na estação.
Esta foi a primeira vez que taikonautas receberam uma encomenda (nave de carga) no Espaço, e também a primeira espaçonave a atracar após a estação espacial ter formado uma configuração em “T”, resultado de dois módulos, Mengtian e Wentian, lançados em último julho e outubro para se juntar ao módulo central Tianhe já na órbita terrestre.
Essas grandes missões marcaram a conclusão da estação espacial Tiangong de três módulos, que atualmente hospeda os três astronautas da Shenzhou 14, Chen Dong, Liu Yang e Cai Xuzhe. Com isso a China conclui a terceira e última etapa do Projeto 921, de 1992, do Programa Espacial Tripulado Chinês que buscava estabelecer uma Estação Espacial com o objetivo de fornecer uma solução para a utilização do espaço humano em uma escala maior e em longo prazo.
A China pretende manter Tiangong ocupada e operacional por pelo menos uma década, o que significa que deve durar mais que a Estação Espacial Internacional (ISS), ironia do destino uma vez que a China foi excluída de participar do projeto da ISS, e poderá se tornar a única estação espacial em órbita acima da Terra. Em comparação, Tiangong tem cerca de 20% da massa da própria Estação Espacial Internacional.
O grande gigante da Ásia tem se envolvido ativamente em intercâmbios e cooperações internacionais de alto nível, expandindo os serviços públicos globais para tecnologia e produtos espaciais. Ajuda ainda a realizar os objetivos da Agenda 2030 das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, facilitando o consenso global e o esforço comum em relação à exploração e utilização do espaço sideral.
Medidas concretas podem ser observadas quando, em 2018, a China, apresentou no escritório das Nações Unidas para Assuntos de Espaço Exterior (UNOOSA), um convite para outras nações conduzirem experimentos a bordo da estação espacial chinesa.
A China se dedica para ampliar as parcerias interacionais e democratizar o acesso ao espaço. Nesse aspecto, o Paquistão, Egito, Tunísia, Arábia Saudita e Argentina já colaboram em importantes projetos espaciais chineses para essa década com a estação espacial, as missões não tripuladas para a lua, a constelação de banda larga LEO e BeiDou.
Mais de 20 países africanos têm programas espaciais para atender questões de desenvolvimento socioeconômico, como mudanças climáticas, monitoramentos ambientais, gestão de desastres naturais e agricultura. A cooperação entre a União Africana e a China viabiliza instrumentalizar essas melhorias sociais.
Com investimentos na ordem de US$ 10,29 bilhões, a China possui ainda uma receita inferior no espaço, quando comparada aos EUA, que em 2021 investiu na sua agencia espacial (NASA) US$ 54,6 bilhões.
“Explorar o vasto cosmos, desenvolver a indústria espacial e transformar a China em uma potência espacial consistem nosso sonho eterno”, ressaltou uma vez o presidente chinês, Xi Jinping, quando estabeleceu o Dia Espacial da China em 2016. A indústria espacial é um elemento crítico da estratégia nacional geral, e o país defende o princípio de exploração e utilização do espaço sideral para fins pacíficos, dessa forma democratizar o acesso e uso é um caminho.