Cooperação para conquistar o Universo
A China começou a dar sua maior contribuição para a pesquisa espacial, uma das mais importantes para o futuro da humanidade, no último dia 15 de maio, quando sua sonda enviada para o planeta Marte, a Tianwen-1, chegou à superfície. Ela vai ficar 90 dias em solo, realizando pesquisas sobre a origem da vida e os segredos do Universo, além de contribuir para o desenvolvimento de novas tecnologias.
Com o êxito, a China se aproxima dos Estados Unidos e da Rússia em pesquisas espaciais, mas quer multiplicar este feito. Valendo-se do conceito de “cooperação espacial”, os líderes asiáticos buscam atrair novas nações à jornada pela conquista do espaço, buscando reunir forças para abreviar o caminho até o melhor entendimento e uso dos recursos espaciais. A iniciativa chinesa mostra-se, inclusive, uma oportunidade para países em desenvolvimento, principalmente o Brasil, como potência regional emergente.
A Tianwen-1 leva seu nome (em chinês, “perguntas ao céu”) em homenagem ao poema homônimo do pensador chinês Qu Yuan, que viveu entre os anos 340 e 278 antes de Cristo. Na obra, o poeta levanta questões envolvendo o céu e fenômenos naturais, questionando mitos tradicionais e buscando a objetividade científica. Nada mais apropriado ao que busca a nova sonda, que permanecerá em Marte por 90 dias, com sua estrutura robótica, e 680 dias com o módulo orbitador.
Às 4 horas do dia 15, o veículo de solo, que possui seis rodas, placa de captação de energia solar e cinco instrumentos científicos, se desacoplou do orbitador e já está em operação. Ele se chama Zhurong, em homenagem à forma tradicional como Marte é chamado pelos chineses, “o planeta fogo”. Zhurong vai realizar monitoramento meteorológico, detecção de campos magnéticos, exploração subterrânea via radar e detecção de incidência solar, a fim de entender melhor a superfície do planeta, a composição de seu solo e rochas, a existência de água congelada na superfície e subterrâneo, e as variações do clima no planeta. Já o orbitador, em seus quase dois anos de trabalho, tentará compreender a atmosfera local, a existência de detritos em órbita e os fluxos energéticos locais.
Por fim, o objetivo final do projeto já está conectado com ideias futuras. Enviando a Beijing informações sobre a topografia e a meteorologia em Marte, serão estudados os posicionamentos ideais para a instalação de aparelhos mais complexos, com robôs que realizem outros tipos de atividades.
Para os países emergentes, abre-se uma porta para o espaço
O êxito chinês recebeu congratulações de todas as partes do mundo, inclusive a Agência Espacial Norte-Americana, além da Agência Espacial Federal Russa e a Agência Espacial Europeia. Nos últimos anos, somente três operações espaciais em Marte foram iniciadas. Além da Tianwen-1, também transcorrem o projeto estadunidense Mars 2020: Perseverance e o Hope Mars, dos Emirados Árabes Unidos.
É isso que a China quer mudar a partir de suas conquistas espaciais, negando a perspectiva de disputa com outras potências. O objetivo, como tem ocorrido em todas as suas parcerias econômicas, é firmar acordos para partilhar tarefas e dividir ganhos e descobertas. Sem disputas nacionalistas e com mais cooperação entre os povos, as lideranças chinesas entendem que os países saem mais fortes, suas populações ganham em autoestima e qualidade de vida, e a humanidade avança de forma mais estável.
Por isso, a Agência Espacial Nacional da China é a principal parceira do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) doBrasil. Desde 1988 eles mantêm o programa Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres, que monitora o estado dos ecossistemas brasileiros, sobretudo seus recursos hídricos e a Amazônia Legal. Até hoje foram seis lançamentos, o último de 2019, dos quais três equipamentos permanecem ativos.
Outra contribuição importante que o Brasil pode dar, buscando uma pesquisa espacial de menos competição e mais colaboração, é o uso do Centro de Lançamento de Alcântara, no litoral-norte brasileiro. Hoje, apenas os Estados Unidos têm acesso ao local, graças a acordo firmado em 2019.
O lugar é considerado o melhor ponto de lançamento de foguetes do mundo, ao lado da Base de Kourou, na Guiana Francesa. Isso porque sua posição, a dois graus da Linha do Equador, favorece a economia de combustível pelos foguetes de lançamento, já que a distância entre o solo e o limite da atmosfera terrestre é menor na zona equatorial. A área é considerada uma das mais seguras do mundo, livre de oscilações climáticas e instabilidade política, diferentemente de outras regiões na mesma latitude. Também é um local de baixa densidade demográfica e longe de ecossistemas vulneráveis, o que minimiza as consequências de eventuais acidentes.
Com um recurso caro como esse a oferecer, o Brasil pode entrar no projeto de cooperação espacial internacional, proposto pela China, em condições de conquistar muito mais avanços científicos, do que mantendo relações unilaterais. Principalmente para transferência de tecnologia e monitoramento territorial.
autor: Hélio de Mendonça Rocha, articulista e repórter de política internacional