Num hospital dedicado à medicina tradicional chinesa no estado da Bavária, na Alemanha, a médica He Zhipin examina alguns pacientes. O que estamos ouvindo ao fundo é a voz do seu intérprete que está fazendo a tradução para ela. He trabalha com medicina chinesa há mais de 30 anos. Para ela, a única diferença de agora é a nacionalidade dos pacientes. Mas o sonho de salvar vidas nunca mudou.
He nasceu em Shenyang, cidade industrial do Nordeste da China, no início da década de 50. Devido às freqüentes mudanças de trabalho dos seus pais, He passou a infância em vários lugares. Aos três anos, toda a família transferiu-se para Beijing, e aos nove, eles se mudaram para Shanghai. No início de 1969, tal como outros jovens estudantes daquela época nascidos em cidades chinesas, He, que frequentava a escola secundária, foi enviada para trabalhar em regiões rurais do país.
Numa aldeia montanhosa da província de Qinghai, He passou três anos. Os agricultores de lá tinham dificuldade de ir ao médico por causa da localização afastada. Ao saber disso, He começou a aprender práticas médicas no seu tempo livre, como por exemplo, dar injeção ou receitas médicas simples. Após receber treinamento profissional, ela tornou-se numa médica rural que atendia os agricultores. Naquele tempo, os médicos que trabalhavam nas zonas rurais foram apelidados de médicos de pés nus. Desde então, a afinidade entre He e a medicina tradicional chinesa só foi crescendo.
"Quando era médica de pés nus, os agricultores não tinham condições para comprar medicamentos alopáticos. Por esta razão comecei a aprender acupuntura e moxabustão e deu certo. Aí, achei maravilhosa a medicina chinesa".
Em 1971, somente com escolaridade secundária, He foi recomendada para estudar medicina chinesa tradicional no Colégio de Medicina de Qinghai. Graças ao seu bom desempenho, ela ficou dando aulas no colégio durante seis anos após sua graduação, até que em 1980 ela finalmente foi admitida como mestrante pela Universidade de Medicina Tradicional Chinesa de Shanghai. Três anos mais tarde, He terminou o mestrado e passou a trabalhar no Hospital de Medicina Tradicional Chinesa Dongzhimen, em Beijing. Lá, atuou como médica especializada e tutora de mestrante. He ainda participou de projetos científicos provinciais e nacionais, além de publicar várias teses e obras acadêmicas na área.
Após as reformas e abertura da China, os intercâmbios no setor de saúde com os demais países do mundo vêm aumentando. He foi três vezes ao Japão e Alemanha como especialista em medicina chinesa. Para ela, foi um grande prazer trabalhar no exterior como embaixadora da medicina chinesa. Seu marido, Ding Jialin, sempre lhe dá uma mão quando precisa.
"Como marido, devo apoiar a carreira dela. Agora nossa filha já está crescida e ela tem mais tempo para dedicar-se ao trabalho. Todos os dias conversamos por vídeo no MSN como se estivéssemos juntos. Claro que eu não queria que ela ficasse tão longe por tanto tempo. Mas acho que posso superar esta dificuldade levando em consideração a importância do trabalho dela".
No fim de 2007, He foi trabalhar no Hospital de Bad Koetzting, na Bavária, Alemanha, que desenvolve um programa de parceria com o Hospital Dongzhimen. É o primeiro hospital da Alemanha voltado à medicina tradicional chinesa. He é responsável pela metade dos 80 leitos do hospital. Todos os médicos de medicina chinesa, massagistas, farmacêuticos, mestres em acupuntura e em exercício Qigong (que visa estimular e promover a circulação de energia Qi) provem da China. A maioria dos pacientes é portadora de doenças crônicas e estão ali em função da boa reputação do hospital.
Segundo He, mais de 70% dos doentes foram curados ali. Ela contou:
"Tive uma paciente que sofria de uma dermatose muito grave. O rosto todo dela estava vermelho quando a vi pela primeira vez. Era terrível. Após seis meses de tratamento ela parecia uma outra pessoa. A pele estava lisa. Fico muito feliz por ela".
He é uma das médicas favoritas entre os pacientes do Hospital de Bad Koetzting. Com aproximadamente 60 anos, ela está sempre sorridente ouvindo as queixas de todos. Martin Sachs trabalha na sede da BMW em Munique. Ele sofre de dores nas costas há muitos anos. Sem outra alternativa, tomou morfina. Após o tratamento com medicina tradicional chinesa, registrou uma melhora significativa. Muito agradecido, ele constatou:
"He é uma pessoa franca e gosta de ouvir seus pacientes, o que acho imprescindível. Podemos procurar a ajuda dela em qualquer momento. Tenho a sensação de ser muito bem cuidado, o que favorece o tratamento. Sei que acertei".
Para o marido de He, ela é uma mulher totalmente dedicada ao trabalho. Ama a vida e é uma excelente cozinheira. Além de tudo, ela sempre tem um grande interesse por tudo. De acordo com a própria He, ela é uma senhora moderna que está sempre na moda nos olhos de jovens.
"Sou melhor nos jogos de computador do que muitos jovens. Tenho meu blog e compartilho com os outros as minhas alegrias. Acho meu tempo livre insuficiente, tenho tantas coisas para fazer".
Faz dois anos que He trabalha na Alemanha. Por falta de recursos profissionais e constante aumento de pacientes, ela nem pôde tirar férias. Há pouco um novo médico chinês juntou-se à equipe do hospital, e agora é hora de He respirar um pouco. Em outubro o marido e a filha vem visitá-la, e seu sonho é aproveitar a oportunidade para levar toda a família a conhecer a Europa.