A companhia chinesa Geely Automobile Holdings Ltd. acertou na semana passada a compra da Volvo, montadora sueca da Ford Motors, por US$ 1,8 bilhão. A negociação, que envolve a aquisição de 100% das ações da marca e de seus ativos, é a maior transação de uma empresa chinesa envolvendo uma marca estrangeira. Alguns analistas veem a aquisição como um "milagre". Para outros, no entanto, a assinatura do acordo é apenas um começo, já que a Geely, com seus 14 anos de existência, vai precisar de tempo para aprender a lidar com a história de 86 anos construída pela Volvo.
No final de 2008, a Ford, presa a uma situação deficitária motivada pela crise financeira internacional, revelou a intenção de vender a Volvo. Em setembro de 2009, a chinesa Geely manifestou o interesse pela aquisição da marca sueca e, logo no mês seguinte, se firmou como a principal candidata ao negócio. Em 28 de março deste ano, a Geely venceu a disputa com a norte-americana Crown e investidores suecos. O diretor financeiro da Ford, Lewis Booth, explicou por que escolheu a Geely.
"Queremos que o novo dono da Volvo possua as mesmas crenças da Ford, para impulsionar os negócios ligados à produção e venda de carros da montadora. Informo a todos, com muita alegria, que esse novo dono é a companhia Geely", afirmou Lewis Booth.
A ideia de mesma "mesma crença" é um pouco vaga, não explica exatamente os motivos que levaram a Ford a optar por vender a Volvo à Geely, uma montadora privada que atua principalmente no mercado de carros populares. As estatísticas podem explicar a decisão de forma racional.
A redução contínua da venda de sedãs pela Volvo nos últimos anos tornou a marca um peso para a Ford. A Volvo comercializou no ano passado 335 mil unidades, um recuo de 10% em relação ao ano anterior. Os prejuízos obrigaram a Ford a se desfazer da marca sueca para obter capital flutuante.
Uma outra razão notória pode ter sido crucial na decisão da gigante norte-americana por uma empresa chinesa. Em 2009, o mercado mundial de carros de luxo sofreu uma queda visível, mas na China a venda desse tipo de automóvel registrou um incremento superior a 40%. Somente as vendas da Volvo cresceram 80% no país.
E por que a Geely? Segundo o relatório anual da empresa chinesa, a montadora conseguiu em 2008 uma taxa de lucro de 20% sobre o preço de custo, mesmo num contexto global de elevação significativa dos preços das matérias-primas e de outros insumos. Além disso, a Geely ganhou a confiança e o apoio do sindicato dos trabalhadores da Volvo por prometer que a empresa manteria a identidade sueca e a independência estratégica. As equipes de gerenciamento e de pesquisa da montadora vão permanecer em Gotembrugo, declarou o presidente da Geely, Li Shufu.
"A Geely é a Geely e a Volvo continua sendo a Volvo. Nós temos plena consciência de que a Volvo tem sua base no norte da Europa. Se sair dessa terra, a Volvo perderá sua raíz e valor. Por isso, a Volvo vai manter sua identidade e continuar no mercado de carros luxuosos. A Geely e a Volvo não vão se misturar", disse Li.
Então, de que forma a Geely irá se beneficiar do negócio? Para o vice-presidente do grupo, Zhao Fuquan, o que a Geely mais preza na Volvo é a capacidade tecnológica acumulada pela empresa ao longo dos anos.
"Como o detentor das ações da Volvo, a Geely detém também a tecnologia chave e a propriedade inteletual da unidade sueca. Do ponto de vista da pesquisa e do desenvolvimento, vamos procurar possibilidades de cooperação entre as duas marcas. Como uma marca de ponta, a Volvo acumula vasta experiência e grande quantidade de tecnologias, que servirá de vantajoso recurso à Geely", explicou Zhao.
Segundo o acordo firmado pelas duas empresas, a Geely passa a possuir nove séries de produtos, três plataformas de produção e 2.400 distribuidores da Volvo, além do seu sistema de pesquisa e desenvolvimento e da rede de fornecedores. Será que a Geely consegue lidar com esses imensos recursos e conduzir a Volvo ao caminho do renascimento? Para o analista Zhong Shi, o primeiro passo a ser dado pela Geely é ajudar a Volvo e se consolidar no mercado internacional, além de concorrer com outras marcas estrangeiras no mercado chinês. Por isso, o sucesso obtido na compra da marca sueca é apenas a primeira vitória da Geely, disse Zhong.
"Depois de comprar a Volvo, a Geely precisa pensar em como fazer a marca lucrar. Isso será uma tarefa muito dura, pois não será fácil para a Geely preservar o mercado que a Volvo detém. E para isso o mercado chinês é essencial. Os prejuízos registrados no mercado externo podem ser compensados no mercado chinês. Além disso, a Geely precisa de tempo e dinheiro para montar a fábrica na China e reajustar equipamentos, e disposição para encarar a concorrência das marcas alemãs no país", falou Zhong.
O presidente da Geely, Li Shufu, disse esperar que a Volvo aumente sua produção.
"O maior problema que a Volvo tem neste momento é o pequeno volume de produção. Comparando com a Mercedes Benz e BMW, a Volvo tem quase a mesma capacidade de pesquisa, mas uma rede de produção bem menor. Devido a isso, o custo de cada unidade de veículo fabricado pela Volvo é alto. Aumentando a produção, o custo de cada peça vai diminuir,"frisou Li.
A Geely planeja construir na China uma nova fábrica para a Volvo, com capacidade de produção anual de 300 mil unidades, aproveitando o potencial do consumo e o baixo custo da mão-de-obra. A meta é pôr fim, antes de 2011, à situação deficitária da Volvo. Para tanto, a Geely precisa injetar mais US$ 900 milhões no projeto. Segundo o vice-presidente do grupo chinês, Yi Daqing, metade desse financiamento vem da parte continental chinesa, e o restante, dos EUA, Europa e Hong Kong. "O dinheiro já está à disposição", garantiu ele.