Já passamos a primeira década do século 21 e, levando em consideração os êxitos e progressos que o ser humano conquistou nesse período, temos toda a razão de nos aplaudir. Os últimos dez anos, no entanto, se caracterizaram também por novas questões como terrorismo, globalização econômica, crises financeiras e mudanças climáticas. São questões que estão afetando e até mudando a nossa vida. A partir desta edição do programa "Panorama Econômico", vamos trazer uma série de reportagens com a retrospectiva da economia mundial na última década.
Há dez anos, ao soar do sino, a economia mundial, que já estava marcada pela crescente globalização, entrou no novo milênio. Economistas de diversos países mantiveram, naquele momento, uma atitude muito otimista em relação ao futuro da economia global. Para eles, a globalização iria levar a economia mundial para uma direção que eles consideravam excelente. Chen Fengying, diretora do Departamento de Economia Mundial, do Instituto das Relações Internacionais da China, recordou a ocasião.
"Economistas de países ocidentais previram que não existiria mais o ciclo econômico. Para eles, o desenvolvimento da economia mundial iria seguir uma trajetória sustentável, e não haveria mais crises financeiras."
Passados dez anos, descobrimos que a globalização dominou realmente o comércio e os investimentos, e que também incentivou a livre circulação dos fatores de produção e dos capitais internacionais. A crise financeira, no entanto, continuou a nos rodear.
Aqui vem a questão: como podemos tirar proveito da globalização econômica, essa faca de dois gumes.
Parte I 2000-2003, aurora da prosperidade
No dia 11 de dezembro de 2001, a China entrou oficialmente para Organização Mundial do Comércio (OMC) e tornou-se o membro número 134 da entidade. Ao mesmo tempo, a União Europeia estava acelerando a unificação das moedas das nações que pertenciam ao bloco. No dia primeiro de janeiro de 2002, o Euro entrou em circulação em doze dos 25 países da União. Tudo isso beneficiou um jovem chinês, chamado Li Zijun, que aprendeu com o seu patrão a primeira lição sobre como fazer negócios.
"O meu patrão tinha muita perspicácia. Ele investiu naquele tempo em uma calculadora que mostrava o câmbio entre o euro e a moeda de cada país membro da União Europeia. O produto foi muito procurado no mercado europeu, e meu chefe ganhou uma fortuna. A empresa dele chegou a ser cotada na bolsa de valores", lembrou Li Zijun.
Alguns anos mais tarde, Li Zijun fundou uma pequena fábrica de produtos de trabalho intensivo, como calculadoras e brinquedos. A vantagem nos preços garantiu o sucesso dele no mercado externo.
"Os produtos chineses têm bons preços. Os brinquedos e vestuários são bonitinhos."
"Vivo na Itália, mas visito a França com frequencia. Ambos os países têm muitas mercadorias provenientes da China. Comprei malas, roupas e colares. A qualidade deles me satisfaz."
De fato, fabricantes e consumidores são beneficiados pela globalização econômica. Desde a década de 90 do século passado, o mundo vem acelerando o passo da globalização. Com a chegada do novo século, o avanço do desenvolvimento das multinacionais impulsionou de forma vertiginosa o livre comércio, a internacionalização da produção, e a globalização das finanças e das tecnologias. Com o ingresso na OMC, a China passou a ter os mesmos benefícios que os outros membros da organização. Passou a concorrer sob condições iguais com outras nações e a participar na elaboração de normas internacionais de comércio. Um ano após a adesão chinesa à OMC, o dragão asiático foi responsável por 17,5% do crescimento da economia global, atrás apenas dos Estados Unidos.
Junto com a China, um grupo de países emergentes começou a chamar a atenção pública, formando uma força determinante para o crescimento mundial. Em 2001, o economista Jim O´Neil, chefe de pesquisa em economia global do grupo financeiro Goldman Sachs, criou a expressão "Bric". Ele estava usando esse termo para designar os quatro principais países emergentes do mundo, Brasil, Rússia, Índia e China. Usando as últimas projeções demográficas, modelos de acúmulo de capital e aumento de produtividade, Jim mapeou as economias dos países do Bric até 2050. O resultado foi publicado com o nome "Building Better Global Economic Brics". A conclusão é que esse grupo de países pode se tornar a maior força na economia mundial, superando as economias dos principais países ocidentais, como Grã-Bretanha, França, Itália e Alemanha, em termos de valor do PIB. Para Wang Yusheng, chefe executivo do Centro de Pesquisa de Estratégias da Fundação de Questões Internacionais da China, a ascensão do Bric é reflexo da pluralização das forças mundiais.
"O Bric é um reflexo da evolução da história. Os países emergentes já formaram um grupo após a Guerra-fria. O Bric representa esse grupo e sua ascensão está mudando as forças mundiais."
Nesse período, no entanto, as principais economias desenvolvidas apresentaram sinais de declínio. Em 2000, a bolha acumulada nos investimentos em Internet nos Estados Unidos começou a estourar, o que levou diversos empresários à falência. Fred Wilson, sócio de uma empresa de capital de risco, recordou a cena.
"Depois que o Netscape fez um IPO (sigla em inglês para oferta pública inicial de ações), a bolha gerou trilhões de dólares em investimentos na internet e colaborou para o desenvolvimento de novas tecnologias e sites conceituados. O investir em ações ligadas a novas tecnologias era como jogar num cassino. O preço de um papel desse pode subir de US$ 15 para 50, ou até 100, em dois dias de pregão! As pessoas acreditavam que essas empresas lucrariam. Mas emfim, acho que eles sabiam que a festa acabaria um dia."
Logo em seguida, o ataque terrorista de 11 de setembro de 2001 e o escândalo da falsificação de extratos de conta, que envolvia empresas gigantescas como a Enron e a Worldcom, afetaram gravemente a confiança dos investidores. Isso provocou a queda das principais bolsas de valores europeias e norte-americanas. Como Estados Unidos, Japão e países da União Europeia correspondiam, naquele tempo, a mais de 70% do PIB mundial, a economia global entrou em um ciclo de baixo crescimento, que durou cerca de dois anos.