Num condomínio popular da cidade de Yixing, província de Jiangsu, no leste da China, uma casa de um piso não parece nada especial. Ao entrar, no entanto, se descobre um mundo curioso: mesas simples, blocos de argila e ferramentas dão o tom. Artesãos batem, cortam e colam um tipo de argila de cor púrpura, a transformando passo a passo em peças de chaleiras de diferentes modelos, simples, mas elegantes.
O lugar se chama Jushage, uma oficina para a criação da chaleira Zisha fundada pelo casal Xu Xiaoping e Xu Qin, ambos praticantes desta antiga arte chinesa.
"Temos na oficina oito pessoas, todas da família Xu. Desde a dinastia feudal Ming, a habilidade da criação da chaleira vem sendo transmitida dentro da família, sem interrupções", apresentou Xu Qin.
Yixing, a cidade onde mora a família Xu, é conhecida pela produção da chaleira Zisha, ou chaleira de "argila púrpura". Nesta cidade com um milhão e trezentos mil habitantes, cerca de 20 mil se dedicam à criação de chaleiras. Aqui se produz especialmente uma argila de cor púrpura e se cultivam folhas de chá. Há 500 anos, os moradores locais começaram a fazer chaleiras com este barro. Como a argila púrpura contém uma estrutura única que permite a excelente conservação da cor, perfume, sabor e temperatura das folhas de chá, as chaleiras feitas com este material estão cada vez mais valorizadas.
Xu Qin nasceu em 1957 numa família dedicada à criação da chaleira Zisha, ao sopé da montanha Shushan, em Yixing. Seu bisavô abriu uma loja de chaleira já nos anos 30 do século passado, exportando os produtos através dos portos de Cantão, no sul, e de Tianjin, no norte do país. Desde pequena, Xu Qin vem recebendo influência dos pais.
"Lembro que a partir do segundo ano da escola primária, a primeira coisa que fazia depois de terminar as aulas e voltar para casa era dois conjuntos de boca, cabo e botão de tampa de chaleira, a pedido dos meus pais. A tarefa aumentou para três conjuntos por dia no terceiro ano, quatro conjuntos no quarto, seis conjuntos no sexto ano da escola secundária e assim por diante. Durante as férias de verão e de inverno, me dedicava ainda mais a isso. Assim, também não sei dizer exatamente desde quando aprendi a elaborar um bule inteiro", lembrou Xu Qin.
Na oficina, o casal Xu Xiaoping e Xu Qin se responsabiliza pelo design e criação dos bules, além de ensinar as técnicas aos aprendizes. A mãe de Xu Qin, Feng Xiya, é uma mestre em escultura de argila. Filho de professores, o marido de Xu Qin, Xu Xiaoping, entrou no mundo da chaleira Zisha quando tinha 18 anos. Aplicado e talentoso, Xu Xiaoping dominou rapidamente a habilidade. Conheceu Xu Qin justamente por causa da chaleira. Em 2003, o casal fundou a oficina Jushage. Ao longo dos anos, os dois vêm se apoiando e aprendendo um com outro.
"Normalmente, mostro para ela os bules que eu faço. Ela vai observá-los a partir do seu ponto de vista mais letrado e apresentar suas opiniões. Às vezes ela realmente me inspira e muda meus fios de pensamento. Aí vou reajustar minhas obras para conseguir um efeito melhor. A minha esposa tem mais conhecimento nas áreas de literatura e arte do que eu, mas sou mais forte em relação à capacidade manual", afirmou Xu Xiaoping.
A mãe de Xu Qin, Feng Xiya, está aposentada. Leva uma vida simples e tranquila. Mas mesmo aos 76 anos de idade, dedica diariamente uma ou duas horas à escultura de argila. Faz principalmente decorações para obras da filha e do genro. Feng Xiya iniciou sua carreira aos 17 anos. Foi aprender escultura em argila com um mestre chinês. Ao longo dos últimos 50 anos, criou inúmeras obras, cujos temas variam entre montanhas, rios, flores, pássaros e figuras femininas.
Feng recorda que a primeira aula que teve não foi sobre a pintura nem a caligrafia, mas sim sobre como amolar uma navalha.
"O meu mestre era muito rígido. Pediu-nos para aprender primeiro a amolar a navalha. Tivemos de amolar o gume de pleno a agudo, e depois de agudo a pleno, repetindo assim milhares de vezes. Só depois de dominar essa habilidade, podíamos seguir com a aprendizagem da escultura", contou Feng Xiya.
As obras produzidas pelo casal Xu vêm ganhando prêmios dentro e fora do país, atraindo cada vez mais compradores e colecionadores. As encomendas não param de chegar à oficina Jushage. O sobrinho de Xu Qin, Zhang Saiyi, estudou contabilidade na faculdade. Após a graduação, há três anos, optou por aprender a fazer chaleira.
"Tive desde pequeno o desejo de aprender a fazer chaleira. Depois da graduação, decidi seguir o tio Xu Xiaoping. A cada ano, aprendo algo. Antes, achava mais importante a função prática da chaleira. Agora, sinto que o design artístico de um bule vale muito também", explicou Zhang Saiyi.
A filha única do casal, Xu Ge, também integrou a família para a transmissão da habilidade. Mas apesar de ter nascido num meio de criação da chaleira Zisha, Xu Ge só começou a se dedicar à arte aos 21 anos, quando se formou em Belas Artes pela Universidade Normal de Nanjing. Ela admite que o processo de aprendizagem é longo e chato. Nos primeiros anos, ela se sentiu farta.
"Depois de acabar a faculdade, como sou filha única, senti que tinha a responsabilidade de seguir o caminho dos meus pais, porque seria uma grande pena se essa habilidade parasse na minha geração. Mas no início, fiquei até um pouco farta. Além disso, a argila machucava muito as minhas mãos. Todos os dias, tinha que ficar sentada horas e horas perante o barro. Com o passar do tempo, descobri os prazeres. Converter um bloco de argila numa coisa que se tem na mente traz uma sensação enorme de satisfação, algo incomparável com o consumo de uma bolsa ou um carro de luxo", disse Xu Ge.
Em comparação com os seus antecessores, Xu Ge tem uma visão mais ampla quanto à divulgação da arte da chaleira Zisha. Em 2010, abriu uma loja na rua Pingjiang, na zona histórica da cidade de Suzhou, perto de Yixing. Além de vender peças da família, promove salões culturais sobre o bule e o chá chinês.