Mandarim de profissão, poeta, pintor, calígrafo, músico, eremita por gosto, pela quietude após o vagabundear do coração, Wang Wei (701-761) é uma das vozes mais sábias no imenso caudal de poesia que, há trinta séculos, inunda o mundo chinês de inteligência e serenidade.
Grande poeta da Natureza, Wang Wei sabe, talvez como ninguém, agarrar nas palavras, embebê-las na ressonância interior de uma sensibilidade fulgurante e depois, pela ponta do pincel - os carateres chineses são escritos com um pincel -, deixá-las flutuar em lagos de magia, finas, de seda, transparentes, como gotas de orvalho humedecendo a terra.
Wang Wei leva-nos consigo através da velha China, em iniciáticas caminhadas por montanhas plenas de vazio. Em boa companhia, vamos ouvir os murmúrios da brisa nos pinheiros, o canto das cascatas nas pedras de um rio, os gritos dos pássaros planando num vale. É um incitamento irresistível para enchermos os olhos, os sentidos, de tranquilidade, paz.
Poeta, pintor, Wang Wei tinha, para além das palavras, o pincel a encher de cor e depois a atitude filosófica, o coração a espalhar-se na superfície branca, de seda ou de papel.
Ainda na dinastia Song, o grande poeta Su Dongpo,ou Su Shi,manifestou por diversas vezes a sua enorme admiração pela obra de Wang Wei e é conhecidíssima a sua frase: Os poemas de Wang Wei são pinturas,as pinturas de Wang Wei são poemas.
Meditando no Outono
No alpendre, um vento gelado
Atravessa a minha roupa fina.
É noite, ressoam os últimos tambores,
Goteja a água na clepsidra de jade.
A lua atravessa a Via Láctea,
Embebeda-a de luz.
Uma pega salta de uma árvore de Outono,
Uma chuva de folhas cai.
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