Tuya's Marriage é um filme construído em duas camadas. Na primeira, temos a história de Tuya, uma jovem mongol, mãe de dois filhos, que passa por uma série de suplícios para sustentar e manter unida sua família. Como pano de fundo, temos o retrato de uma comunidade que se esvai (os nômades da Mongólia), uma cultura prestes a desaparecer em meio às exigências da modernidade e o aculturamento imposto pelo governo chinês. Enquanto retrato dessa comunidade, Tuya's Marriage se aproxima de obras como Mongolian Ping Pong e Camelos Também Choram, embora o faça de uma forma menos exótica e idílica e mais próxima do cotidiano dessa família. É como se Wang Quan'an quisesse com seu filme - e através desse microcosmo da família de Tuya - preservar para a posteridade o modo de vida de todo o povo mongol, num registro quase antopológico dos hábitos e da cultura dessa comunidade em vias de extinção.
Fica clara ao longo do filme a dificuldade daqueles personagens em se adaptar às mudanças exigidas por essa modernização. Daí a recorrência da bebida como uma forma de suplantar as dores, e o suicídio como uma alternativa extrema, mas presente. O próprio cortejo de pretendentes à mão de Tuya (que se divorcia de seu marido apenas para poder conseguir outro homem que a ajude a sustentá-lo) parece indicar esse avanço inexorável da modernidade sobre aquela família, com seus meios de transporte evoluindo a cada visita (indo de cavalos para motos e, finalmente, para o carro). Mesmo a presença de um televisor no momento em que o marido de Tuya tenta se matar, e o sonho de seu vizinho em comprar uma caminhonete (uma vez que o amor de sua esposa parece estar condicionado às suas posses), demonstram essas mudanças culturais que assolam os mongóis, num simbolismo semelhante ao encontrado na bolinha de pingue pongue em Mongolian Ping Pong.
Todas essas questões surgem e são desenvolvidas a partir de Tuya e suas relações: com os filhos, com o marido incapacitado, com o vizinho que nutre uma paixão secreta por ela, com os novos pretendentes e, finalmente, com seus afazeres cotidianos. É na identificação do espectador com essa personagem (e, através dela, com toda a cultura mongol), que o filme aposta todas as suas fichas - e é justamente aí que reside sua principal fraqueza. Embora Yu Nan faça um bom trabalho como a protagonista do filme, há pouco espaço no roteiro para que essa identificação ocorra de fato, como quase ocorre nas cenas onde Tuya e os filhos vão visitar o pai no hospital ou quando ela parte atrás do filho mais velho em meio a uma tempestade de neve. Fonte: Brasília no Cinema
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