No interior do deserto noroeste da China, está enterrado um ancião. Se ele vivesse hoje, provavelmente completaria 100 anos este ano. Em 1994, ele faleceu em Beijing. Nascido à margem do lago Oeste em Hangzhou, sul da China, pediu para ser enterrado no deserto, querendo guardar as grutas Mogao, às quais se dedicou por toda vida. Chama-se Chang Shuhong, ex-diretor do Instituto de Pesquisa da Arte de Dunhuang. O seu elo com as grutas Mogao teve início num livro intitulado Catálogo de Afrescos de Dunhuang.
Paris, França, tinha sido o paraíso da arte para o jovem Chang Shuhong. Em 1935, Chang completou dez anos de estudo de pintura ocidental na França. Naquele tempo, ele adorava as artes da Grécia, Roma e Itália Antigas. Tinha uma família feliz. A esposa foi a primeira escultora chinesa a estudar na França. Numa tarde de outono, Chang descobriu um livro numa loja localizada à beira do rio Senna e ficou surpreendido: As fotografias mostravam afrescos de mais de mil anos cheios de vigor esfuziante, com traços mais rústicos que dos feuvistas. A partir daí, ficou fascinado pela arte das grutas de Dunhuang. Tomou uma decisão que mudou o destino da família e a história da arte da China - ir a Dunhuang.
Em 1936, ele voltou a Beiping, atual Beijing. No entanto, devido às agitações e guerras no país, não conseguiu ir imediatamente a Dunhuang. Após o Incidente de 7 de julho, eclosão da guerra da invasão japonesa à China, a família dos Changs viajava pelas províncias do sudoeste tentando fugir da guerra, e perderam os bens familiares num bombardeio promovido por invasores. ??
Em 1941, Chang Shuhong e sua família chegaram a Chongqing, onde realizou com êxito sua exposição de pinturas, e reuniu-se com seus amigos que conheceu na França para falar de Dunhuang.
Em 1942, sob as pressões da opinião pública, o governo decidiu criar o Instituto de Pesquisa da Arte de Dunhuang. A convite, Chang Shuhong decidiu ir a Dunhuang.
Em fevereiro de 1943, Chang Shuhong se despediu da esposa e filhos e partiu para Dunhuang. Mais de um mês depois, em viagem feita de caminhão e camelo, dia 24 de março de 1943, chegou finalmente a Dunhuang e logo tornou-se um fã da arte de Dunhuang, ou "louco de Dunhuang" como ele próprio se batizou.
Não demorou nem mais um minuto para correr às grutas. Dezenas de anos mais tarde, lembrava-se claramente da sensação vibrante que sentia aquele momento. Escreveu em sua biografia assim: "todas as grutas possuem seu fascínio artístico sensacional. Os meus conhecimentos sobre este grande acervo de tesouros eram superficiais e pobres. As centenas de grutas demonstram uma sabedoria genial que combinam as artes do budismo e taoismo e da vida secular durante mais de mil anos desde a dinastia Jin até a dinastia Yuan, integrando-se ainda as culturas chinesas e ocidentais".
Na gruta de sutras mudialmente famosa, Chang Shuhong sentia muito. Em 1900, foram descobertos nessa gruta cerca de 30 mil objetos culturais, quase um terço das peças foram roubadas depois pelo francês Paul Pelliot e outros aventureiros estrangeiros. Quando Chang chegou, restavam na gruta apenas uma estátua de escultura e um afresco. Em sua biografia, Chang escreveu: "Passados 30 ou 40 anos depois do saque dos tesouros, as grutas continuavam sem a mínima proteção, sem administração e sem manutenção. Viam-se rebanhos em frentes das grutas, desmataram as árvores em sua volta, viajantes usavam as grutas como abrigo, cozinhavam em seu interior não se preocupando com a preservação do local".
A vida de Chang Shuhong em Dunhuang iniciou-se sob condições difíceis. Cortou ramos de árvore como pauzinhos da primeira refeição e enfrentou na primeira noite uma tempestade de areia. A partir do segundo dia em Dunhuang, começou a limpar as areias acumuladas nas grutas e construir um muro de barro para proteger a área das grutas. A proteção das grutas de Dunhuang começou com a chegada de Chang Shuhong, guarda da arte de Dunhung.
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