Talvez Bailu tenha transcendido o mundo ocidental, quando, no início do século XX, um missionário católico francês, fascinado pela beleza do lugar, ergueu um seminário teológico sobre os morros da colina que cercam a aldeia. Desde então, os habitantes locais denominaram o edifício branco - de estilo clássico - e sua capela como a "Notre Dame de Bailu", por sua semelhança com a catedral francesa.
A Academia Superior de Bailu foi o primeiro seminário católico no sudoeste da China. Foi construída em 1908 no povoado de Bailu, na cidade de Pengzhou, em Sichuan. Em 12 de maio de 2008, cem anos depois de sua construção, o emblemático conjunto arquitetônico foi destruído em apenas oito segundos depois das sacudidas do terremoto de 8 graus na escala Richter, ocorrido em 12 de maio de 2008. Desta vez, o 8 - número de sorte na cultura chinesa ? converteu-se em 4, cuja pronúncia, em chinês, é semelhante ao caractere de "morte".

A estrada que vai de Chendu a Pengzhou é uma via sem maiores congestionamentos e tráfego, e nos leva ao povoado de Bailu. Em uma hora de viagem, surpreendem-me as imagens vívidas do processo de recuperação. Abrigos provisórios, lares inóspitos, ruínas, escombros, desolação? vão sendo substituídos pelos rastros de homens e mulheres dedicados às tarefas de reconstrução. Novas casas coloridas e edifícios institucionais vão mudando o panorama da destruição.
O acesso se torna cada vez mais estreito enquanto entramos em Bailu. Finalmente "Daole", ou seja, chegamos ao nosso destino, como dizem os chineses.

Bailu é um povoado pequeno: materiais de construção, pessoas trabalhando, a vida dos habitantes em torno de suas famílias e negócios pessoais, a agricultura de subsistência, uma mesa de bilhar no meio da rua, o mercado local de carnes, vegetais, raízes e brotos de bambu, casas de chá e restaurantes de estilo campeiro coexistem com paredes rachadas, escombros, tetos e paredes derrubadas. As novas habitações evidenciam como os danos do terremoto vão se transformando de ferida à cicatriz, que representa um terrível momento que está sendo superado.
Mas, além da poesia, dos contrastes e dos encantos de um povo do interior, Bailu se dedica à atividade agrícola, à mineração e ao cultivo de plantas indispensáveis para o tratamento na medicina tradicional chinesa.

A Huang Lian cresce a 3 mil metros de altura, nas montanhas da região, e é uma das principais fontes de renda dos camponeses locais, pois o quilograma é cotado em 250 Yuans (RMB). No pequeno espaço de 1 mu pode-se produzir 700 kg da planta mágica.
O Sr. Zhu Lai tem exercido medicina em Bailu há 32 anos. É um dos poucos médicos da região que se dedicam à prática da medicina tradicional e ocidental. Com a tristeza de suas memórias, Zhu relata como o hospital do povoado ficou em ruínas depois do sismo de maio de 2008.
Mais de 400 feridos foram atendidos na sede provisória da instituição sanitária, estabelecida com a ajuda da empresa Philips, assim como o apoio oferecido pela Cruz Vermelha internacional, organizações humanitárias e o governo central, provincial e municipal. Atualmente, o Dr. Zhu colabora com a capacitação e o treinamento da redução de desastres da área de atenção médica.

A casa do médico chinês foi seriamente afetada, incluindo o primeiro piso, onde ficava o restaurante de sua esposa, Li Tian Yu. Depois de viver mais de quatro meses em tendas, a família deu início à reconstrução do lugar. Foi então que a Sra. Li decidiu mudar o perfil de seu estabelecimento e o converteu em uma loja de materiais de construção, "não em um modo lucrativo, de se aproveitar da situação", disse, "e sim como uma maneira de facilitar o acesso das pessoas que necessitavam dos materiais para reconstruções totais ou parciais".
O governo chinês, em seus diferentes níveis, designou 30 mil Yuans a cada família com o objetivo de os ajudar na reconstrução de suas casas. Com essa ajuda, os moradores terão de pagar somente 1/5 do estimado em investimento na execução de suas novas casas.
Ao pé de uma montanha, à margem do rio, está a Escola de Ensino Fundamental de Bailu. O moderno edifício foi danificado consideravelmente pelo terremoto. Para chegar à instituição, agora convertida em uma espécie de "Museu do Terremoto", tinha de se cruzar a Yu Xiasong. A ponte também foi construída por missionários franceses para facilitar o acesso a Notre Dame da China, próxima à escola. Depois de um século, Yu Xiasong deixou de conectar as orlas do rio, quando destruída pelos tremores.
Pontes feitas de troncos de árvores e bambu nos levam à orla oposta, onde fica a escola. Paredes rachadas, edifícios adjacentes derrubados? também são o panorama da destruição.

Na tarde de 12 de maio de 2008, em plena jornada escolar, Bailu se estremecia com o tremor originado em Wenchuan. Milagrosamente, e também graças à rapidez dos professores, os alunos foram evacuados até o rio, minimizando os danos causados aos infantes. Contudo, o edifício localizado na parte de trás da instalação se elevava 3 metros do nível que compartilhava com a construção em sua frente.
Estes feitos conferem ao edifício a categoria de "mágico", como está escrito em caracteres chineses localizados agora em suas paredes rachadas. Contudo, mais que magia, trata-se de um terrível resultado do movimento das placas tectônicas nesta região.
De volta ao centro do povoado, junto a minha colega tcheca Hanna - que fala espanhol perfeitamente -, submirjo na alegria das pessoas desse lugar, que vivem com o sorriso e a esperança de um futuro melhor.
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