Era uma vez um velho inteligente e sábio, que tinha um filho. Um dia, o velho admoestou o filho dizendo-lhe que, de pessoas astuciosas, era melhor não ser amigo, e que não pedisse dinheiro emprestado aos que se tivessem tornados ricos há pouco tempo, nem contasse segredos aos outros, incluindo a própria mulher.
O filho pensou repetidamente nas admoestações do pai e, quis pô-las à prova. Um dia, encontrou uma pessoa astuciosa e com ela fez amizade, e no mesmo dia pediu emprestado algum dinheiro a um homem recém-enriquecido. Quando chegou à casa, matou um carneiro às escondidas e sujou o casaco com o sangue do carneiro. Depois, disse à mulher: "Vai lavar-me o casaco! Matei uma pessoa e o seu sangue sujou-o!" Depois, como se realmente tivesse acontecido o que contara, disse à mulher, com ar circunspecto, que não devia dizer nada a ninguém, senão haviam de surgir complicações. E, logo a seguir, mostrou-se preocupado por lhe ter revelado o seu segredo, ao que a mulher lhe perguntou se não confiava nela.
Passado algum tempo, por causa dum pequeno desentendimento, a mulher foi ter com o rei, e disse-lhe que o marido matara uma pessoa, ao que o rei imediatamente mandou que prendessem o assassino.
A caminho do palácio real, o filho do velho foi a casa do seu amigo astucioso e pediu-lhe para ser testemunha, porque ele sabia que o rapaz tinha morto um carneiro e não uma pessoa. Mas, o homem astucioso que era, não se quis ver implicado o assunto, e desculpou-se ter muito que fazer, e não ter tempo de ir ter com o rei para lhe explicar o que na verdade acontecera. Encontrou depois o rico que lhe emprestara o dinheiro, que lhe perguntou o que tinha acontecido. O rapaz contou tudo. Depois de o ouvir, o rico pensou que, se o rapaz fosse preso, não lhe podia devolver o dinheiro, e por isso, obrigou-o a pagar-lhe o quanto lhe devia.
Quando chegou à presença do rei, de cabeça baixa, o rapaz contou ao monarca os conselhos que lhe dera seu pai e o que na verdade tinha acontecido. Ouvindo isto, o rei ficou muito admirado pela inteligência e sabedoria do pai do rapaz, e julgou ter na sua presença um jovem inteligente, pois não acreditara com ligeireza nas palavras do pai, outrossim, queria comprovar a sua veracidade. Apreciando muito pai e filho, libertou o rapaz. Mas, ficou pouco tranquilo, pensando que tanto o velho como o rapaz, eram pobres mas inteligentes e sabiam mesmo mais do que ele, e poderiam usurpar-lhe o trono. Decidiu assim matá-los! Chamou seu homem de confiança, e deu-lhe ordem de enterrar vivos pai e filho...
Mas, pouco tempo depois, ao comer um pedaço de carne, um osso atravessou-se-lhe na garganta. Todos os médicos famosos do país foram chamados, mas não havia que o curasse. Alguém disse então ao rei que se o velho e o seu filho ainda estivessem vivos talvez soubessem como curá-lo. O rei ordenou logo que os desenterrassem e trouxessem à sua presença, se, claro, ainda estivessem vivos!
Abriram a grande cova, para onde os tinham atirado e ambos estavam ainda vivos, porque, o pai, previdente, levara consigo um saco com queijo, que lhes permitira alimentar-se. Mas, os dois recusaram ir à presença do rei, que os condenara sem razão. Ora o rei, que acima de tudo tinha medo de morrer, ofereceu-lhes toda a sua riqueza e mesmo o trono para que o salvassem.
Os dois apareceram então no palácio do rei, e este implorou-lhes que esquecessem o erro que cometera e o ajudassem livrar-se do horrível mal que o afligia. "Excelência", disse-lhe o velho, "não é difícil salvar a vossa ilustre vida, mas, para isso, deverá Vossa Senhoria pagar um alto preço ? matar o príncipe, vosso filho único".
Ora o rei, que gostava muito do filho, não assentiu no desejo do velho, mas os conselheiros disseram-lhe que, se a sua vida fosse salva, era quanto interessava e que valia a pena sacrificar tudo o que tinha, incluindo o filho. Por fim, embora relutante, o rei assentiu.
O velho fez então deitar o rei na sua cama, donde este pudesse ver o príncipe atado, e o velho com uma enorme faca brilhante e bem afiada, preparava-se para o matar. Vendo o rei assustado e triste, o velho mandou que ocultassem aos olhos do rei a execução do filho deste. Depois, o velho pegou de novo na faca e desapareceu por trás da cortina que tinha feito instalar. O rei, sustando a respiração, pôs-se à escuta, temendo pelo filho. De repente, um grito agudo ouviu-se em todo o palácio e o rei, um grande soluço, desatou a chorar, ao que, por se lhe contrair a garganta, o osso saiu-lhe da boca! O velho disse então ao rei que tinha morto não o princípe, mas um carneiro, ao que o rei ficou muito contento, e respeitando a sua promessa, cedeu ao velho e ao seu filho todos os bens que possuia incluindo o trono.
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