Havia em tempos idos um rico, que não tinha, por assim dizer, amigos... De facto, ninguém gostava dele, porque era tão avarento, que pela mais pequena coisa, a mais insignificante ninharia, mesmo do tamanho dum grão de sésamo, lá estava ele a fazer contas e mais contas... Toda a gente dizia que ele havia de pagá-las um dia, que um dia... Elas cá se fazem cá se pagam, e cada um terá a sua recompensa... "Gente deste tipo", diziam, "chega ao dia em que pagam as contas atrasadas..."
O rico não gostava de ouvir isto, mas nada podia fazer. Ora este homem rico tinha um filho, e se dizer se pode que contas havia a pagar, estava afinal já a pagá-las, pois o filho era idiota.
Certo dia, resolveu o rico chamá-lo e dizer-lhe que pois se já era homem feito, era altura também que começasse a saber o que custava a vida. O idiota nada percebia de nada, nem capaz era de distinguir uma batata dum nabo! Assim, resolveu o pai entregá-lo aos cuidados de alguém que o acompanhasse pela cidade, para que o filho pudesse ver que as coisas tinham o seu preço cada uma, e que não era fácil obter riqueza. Dito e feito, lá foram porta fora o idiota e o seu guardião.
Quando chegaram frente à porta da loja do escultor, o idiota viu dois leões de pedra que muito lhe agradaram, um maior e outro mais pequeno, e apressou-se a perguntar o preço, pois resolvera adquiri-los e mostrar ao pai que também ele sabia o preço e valor das coisas. Ora o escultor que o reconhecera, e o sabia idiota, não perdeu a oportunidade de fazer valer a sua mercadoria. Quando o filho do rico lhe perguntou quanto custavam os dois leões, respondeu-lhe aquele, como quem faz um preço para amigos: "o mais pequeno custa três mil lingotes de prata, e o maior cinco mil".
Ao que idiota respondeu que o preço não era nada caro e que lhe levasse a casa os dois leões...
Como fossem pesados, o escultor carregou primeiro o pequeno, num carrinho de mão, até à casa do rico. Ali chegados, o idiota apressou-se a ir procurar o pai para lhe dar conta de que fizeram um bom negócio, e comprara boa mercadoria a baixo preço. Quando o pai lhe perguntou que mercadoria, o filho respondeu-lhe que se tratava de dois leões de pedra. Quando viu a escultura, o pai perguntou-lhe quanto pagara por ela, ao que o idiota lhe respondeu, muito orgulhoso, "três mil lingotes de prata". Como cada lingote pesava cinquenta gramas, o pai deitou as mãos à cabeça, e amaldiçoou o filho com quanta raiva a avareza lhe dava. "Gastar tanto dinheiro numa coisa sem valor nenhum! Não há dúvida de que ter um filho idiota é pior do que uma calamidade! Não é de estranhar que toda a gente diga que eu um dia ainda havia de pagá-las e bem pagas!" Ao ouvir o pai, o idiota muito contente, virou-se para ele e disse-lhe "este não se pode dizer que tenha sido assim lá muito bem pago; o outro sim, que foi um bom negócio!, mas vai ser preciso pagá-lo também"...
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