BRICS, reformas e o futuro

Fonte: CRI Published: 2017-09-01 17:28:23
Share
Share this with Close
Messenger Messenger Pinterest LinkedIn

Barreiras para o desenvolvimento no contexto dos BRICS:

Segurança é uma barreira ao desenvolvimento. Em todos os sentidos. Desde segurança nacional até, e principalmente, a individual. E é por causa dessa última que amargam na estagnação Brasil, Rússia e África do Sul. No Brasil, gostamos de comentar como as pessoas devem ser cerceadas num país comunista como a China. Podemos dizer que as coisas não são perfeitas em terras chinesas, mas são infinitamente piores nos três países estagnados do BRICS. Podemos dividir os problemas de segurança em três:

Segurança individual:

Segurança de renda: uma repórter uma vez fez uma singela pergunta sobre a importância das instituições para o crescimento econômico. No caso brasileiro (e no russo, por exemplo), bastaria diminuir as instituições extrativistas, melhorando o combate a corrupção e diminuição dos privilégios, que a economia decolaria no longo prazo. Mas não é bem assim. Esses países têm uma diferença muito grande dos gigantes asiáticos: não há a primeira segurança individual, que é o direito à vida e nem a segunda etapa, que é o direito à sobrevivência.

Brasil e África do Sul, em particular, são dois dos países mais violentos e desiguais do mundo. No passado, o Brasil era conhecido como Belíndia, uma mistura de uma elite rica e pequena como a Bélgica e uma imensidão pobre como a Índia. Saímos, assim como os sul africanos, da pobreza comparável à Índia. Estamos, contudo, presos na armadilha da classe média, onde nossos cidadãos estão sujeitos a morrer ou simplesmente vivem em pobreza, sem perspectivas de futuro.

Segurança individual também é esperança. Nos gigantes asiáticos, a maior parte dos jovens sabe que tem grandes chances de viver melhor do que os pais. No Brasil, tivemos um respiro disso de 2005-2010, quando vivemos o boom das commodities e os governos não tinham destruído a economia, como o fizeram de 2009-2014. Hoje, não temos segurança nem esperança.

A armadilha da classe média é baseada em instituições extrativistas, como o horroroso judiciário brasileiro ou o sistema autocrático russo. Mas a desigualdade é um grande obstáculo. Para isso, somente reformas profundas na sociedade poderiam nos tirar desse caminho. Vamos ver como a China reorganizou sua economia para poder dar esse salto e o que os outros BRICS têm a aprender com o gigante asiático.

Reformas na China:

Em um artigo da Folha de São Paulo descrevo algumas das reformas chinesas que permitiram o país sair da extrema pobreza para a classe média. Refaço os argumentos com algumas modificações. O sucesso econômico chinês desde o fim da década de 1970 é impressionante e multifacetado. Não há somente uma razão para ele, é claro, mas, entre muitas características, como câmbio desvalorizado e política monetária frouxa, as mais importantes foram, sem dúvida, as reformas microeconômicas.

Reformas microeconômicas mudam os incentivos econômicos de pessoas e empresas. Elas incluem alterações nas regras de direitos de propriedade, impostos, alocação de crédito, emprego, previdência, atividades rurais e regras de uso de propriedade comum, entre outras.

A China começou suas reformas no fim da década de 1970 com Deng Xiaoping e somente depois delas começou a crescer desenfreadamente. As reformas começaram na agricultura, que na época concentrava quase 90% da população. As principais foram acabar com a coletivização da produção agrícola e introduzir o sistema de responsabilidade familiar, no qual cada família passou a ter a posse da sua terra desde que continuasse vendendo parte da sua produção ao Estado.

Nas áreas urbanas, a principal transformação foi o abandono do planejamento central, com incentivos à produção e ao consumo privados. Em um primeiro momento, a burocracia estatal ainda tentava direcionar preços, subsídios e crédito (o sistema jingji ganggan), mas aos poucos os mecanismos normais de mercado foram estabelecidos.

Famílias passaram a ter direito de propriedade sobre seus imóveis, em áreas urbanas. O que vale para os imóveis vale também para empresas estrangeiras, facilidade de comércio internacional, pagamento de impostos, acesso ao crédito e tudo mais que compõe o ambiente capitalista moderno.

Entre 2001 e 2004, o governo privatizou quase metade das empresas estatais, que hoje são muito menos importantes —à exceção dos bancos comerciais— que no passado. Até 1986, empresas estrangeiras não podiam ter subsidiárias na China sem parceiros locais. Hoje, é possível que empresas estrangeiras se estabeleçam na China sem nenhum parceiro local.

O resultado de todo esse esforço de modernização e reformas microeconômicas pode ser visto na evolução recente do ambiente de negócios na China. Em todas as dimensões, nos últimos dez anos tem ficado cada vez mais fácil fazer negócio na China, enquanto o mesmo não pode ser dito nos outros países do BRICS.

Em vários aspectos sociais, a China ainda tem muito que evoluir. Mas, em termos de direitos econômicos, a "comunista" China está melhorando e já está bem à frente dos "capitalistas" Brasil, Rússia, Índia e África do Sul.

Reformas econômicas são extremamente importantes e explicam grande parte do sucesso chinês. Esse movimento pela modernidade é uma das grandes lições para os países empacados na armadilha da classe média; o foco do Brasil, Rússia, Índia e África do Sul deveria ser em reformas microeconômicas. Elas podem não garantir o crescimento do ano que vem, mas devem realmente criar as condições para um futuro próspero.

Reformas nos BRICS:

A grande lição para os países do BRICS é que boas reformas funcionam. E é por isso que movimentos recentes em Brasil e Índia. Para o Brasil, isso significa sair da pior crise econômica da sua história. Para a Índia, o que importa é dar o primeiro grande salto de desenvolvimento, saindo da pobreza para a classe média.

Uma das grandes reformas no sistema econômico indiano é a grande reforma do sistema tributário em curso hoje. O país criou um grande imposto sobre valor agregado nacional, substituindo dúzias de impostos indiretos locais e estaduais. Dos 29 estados indianos, 22 já aprovaram essa reforma, iniciada em 2017. O banco central americano, em um estudo, estima que só essa reforma vai trazer 4.2% de crescimento para a indústria, incipiente, do país. A reforma do sistema tributário indiano é exatamente o tipo de reforma que cria situações no qual todo mundo ganha, desde os trabalhadores, até empresas e governo.

Enquanto na Índia e China os governos pensam no futuro, reformando vários setores da economia, Brasil, Rússia e África do Sul estão presos em um ciclo vicioso de fragilidade política ou instituições extrativistas. O Brasil até tentou trazer para discussão reformas profundas, como a da previdência, mas falhou pela fraqueza de um governo no qual o presidente é gravado recebendo empresários na surdina.

Os BRICS viraram uma importante instituição multilateral. É importante que o grupo trabalhe para incentivar que seus membros evoluam, institucionalmente e economicamente. O grupo fracassará se for usado como instrumento de manutenção do status quo, principalmente nos países estagnados (Brasil, Rússia e África do Sul). Há muito potencial para criação de valor global. Por exemplo, a disputa de fronteira entre China e Índia é uma excelente oportunidade para mostrar que essa nova instituição é uma forma real de cooperação internacional, na cúpula dos BRICS que acontece em duas semanas. Um grupo que reforce reformas econômicas que melhorem a produtividade dos parceiros pode criar valor para o mundo. Uma instituição que, do ponto de vista interno, serve para amenizar conflitos diplomáticos e que, externamente, promove uma agenda progressista de reformas institucionais. É hora de mostrar que os BRICS importam de verdade. 



HomePrev12Total 2 pages

Share

Mais Populares

Galeria de Fotos

Vamos proteger a Terra com ações práticas
Terras abandonadas são transformadas em parque de chá em Yingshan na província de Sichuan
Confira o local da Conferência Anual 2022 do Fórum Boao para a Ásia
Amantes de esportes aquáticos no rio de Yinchuan
Rio Amarelo passa por campo agrícola em Yuncheng
Quanzhou adota cortes de impostos e taxas para ajudar na retomada da produção de empresas locais

Notícias

Explosões no Afeganistão deixam pelo menos 34 mortos e 102 feridos
China faz importantes contribuições para transformação digital, diz ex-ministro brasileiro
Como a China mantém a autossuficiência diante do salto internacional dos preços dos alimentos?
Começa o Carnaval de 2022 no Rio de Janeiro
Novos subtipos da Ômicron ganham força nos EUA
Baleia encalhada é resgatada no leste da China