Visão: China investiu US$ 66 bilhões no Brasil entre 2007 e 2020, mostra estudo
Autor: Janaína Camara da Silveira, jornalista e mestre em Economia, à frente do projeto Radar China
O Brasil é o país da América do Sul que mais recebeu investimentos chineses entre os anos de 2007 e 2020: 47%, segundo o estudo lançado pelo Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC) intitulado Investimentos Chineses no Brasil – Histórico, Tendências e Desafios Globais (2007-2020). De acordo com a pesquisa, são US$ 66,1 bilhões investidos em 176 projetos em todas as regiões do país e, em pelo menos, 23 estados.
Segundo o texto, estima-se que 34,5 mil empregos foram criados no Brasil entre 2003 e 2020 por conta da entrada de novos projetos chineses, ao mesmo tempo que as aquisições de ativos já existentes mantiveram 140,4 mil postos de trabalho no país.
Na América Latina e Caribe, a fatia investida no Brasil chega a 35%. Ou seja, quase um terço do que chega à região fica no Brasil. O texto aponta que na América do Sul, o Brasil é seguido pelo Peru, com 21% dos investimentos, Chile, que recebeu 11% dos recursos, e pela Argentina, destino de 9% do montante.
Como destaca a diretora-executiva do CEBC, Cláudia Trevisan, trata-se do mais completo estudo sobre os investimentos chineses no Brasil já lançado. O autor, o diretor de Conteúdo e Pesquisa do Conselho, Tulio Cariello, é um dos principais pesquisadores do tema no país sul-americano. Integra a equipe do CEBC responsável pela publicação desde 2014. Segundo ele, em entrevista exclusiva, o estudo atual traz “todo o histórico de investimentos chineses no Brasil de 2007 a 2020, com detalhes sobre os setores, o estoque, o fluxo, a forma de ingresso, e em que regiões do país e estados os investimentos estão concentrados”.
No Brasil, diz o texto, o setor de energia – incluindo eletricidade e petróleo – respondeu por 76% do valor investido pela China entre 2007 e 2020. Só em eletricidade, foram 48% dos recursos. Já a exploração de petróleo e gás responde por 28% do total. Ambos os setores são bem mais receptores de recursos do que a agropecuária, por exemplo, em que os chineses investiram 3% neste período.
Embora não apareça como líder em montante investido, a indústria manufatureira foi o segundo setor com o maior número de projetos da China no Brasil, com empreendimentos em áreas como maquinário pesado e eletroeletrônicos. Para Cariello, tal fator se deve pelo fato de que alguns projetos de infraestrutura, mesmo que em menor escala no montante, recebem aportes maiores devido à sua complexidade.
Para a diretora de Economia do CEBC, Fabiana D’Atri, também coordenadora do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do banco Bradesco, há um amadurecimento da relação de investimento entre Brasil e China: “As fases foram se acumulando. Não se deixou de investir em commodities, passou a haver também investimentos no setor manufatureiro, financeiro e de serviços”, disse a economista durante evento online de lançamento do estudo.
Tal gama de setores em que os chineses investem no Brasil pode ser resultado da atratividade do país. E esta existe porque, segundo o coordenador de Cooperação Internacional do IPEA e membro do Comitê Consultivo do CEBC, Renato Baumann, "o investimento chinês no Brasil é justificado pela oportunidade de negócio: perspectiva de rentabilidade explica a presença de tantas empresas chinesas em um setor non tradable como o de energia", afirma, ao exemplificar com o setor que mais recebeu recursos chineses até hoje no Brasil.
O estudo, que pode ser acessado completo e em português no endereço https://www.cebc.org.br/download/6662/, revela que 2010 foi o ano com maior aporte por parte da China: US$ 13 bilhões, número muito superior aos US$ 1,9 bilhão de 2020, por exemplo, que se explica, em grande parte, pela pandemia do coronavírus, afirma Cariello. No ano anterior, 2019, o Brasil havia recebido US$ 7,3 bilhões em investimentos chineses divididos em 25 projetos, a maioria na região Nordeste, algo inédito até então.
China desponta como potencial líder no fluxo de investimentos
O texto do CEBC mostra que, especialmente a partir de 2010 e de um crescimento que se viu a partir de então (com alguns anos apresentando retração, caso especialmente de 2020), a China passou a rivalizar com importantes investidores estrangeiros no Brasil. Em uma amostra que considera a presença de Estados Unidos, China, Japão, França e Itália, a Secretaria-Executiva da Câmara de Comércio Exterior (Camex) do Ministério da Economia brasileiro (2019), indica que o país asiático é o segundo principal investidor em termos de estoque entre 2003 e o terceiro trimestre de 2019, com fatia de 30,9%, atrás apenas dos Estados Unidos. Estes lideram com participação de 31,2%.
Em termos de fluxo, os americanos foram, até o final da década passada, a maior fonte de investimentos externos no Brasil. A partir de 2010, os investimentos chineses ganharam importância, com rápido crescimento em termos de valor, fazendo com que EUA e China se alternassem na posição de maior investidor no país entre 2010 e 2017, segundo dados da própria Camex e apresentados no estudo do Conselho Empresarial Brasil-China.
Espaço para maior diversificação
Para o ex-embaixador do Brasil na China, Marcos Caramuru de Paiva, membro do Comitê Consultivo do CEBC, a "China está se colocando como um ator protagonista na economia de baixo carbono, criando um ambiente de oportunidade para as empresas chinesas irem para o exterior, sendo o Brasil um ótimo mercado para investimentos no setor de sustentabilidade". Este é apenas um dos setores que podem ver aumentar o aporte de recursos vindos da China.
Segundo o estudo do CEBC, existem oportunidades de inovação na agenda bilateral que poderiam se beneficiar do crescente avanço da China nas novas fronteiras da tecnologia da informação. No texto, o autor indica que a entrada de investimentos chineses nessa área no Brasil ainda é um fenômeno recente e restrito a um número relativamente baixo de atores, mas oferece um grande potencial para projetos ligados a temas como inteligência artificial, economia digital, internet das coisas, rede 5G e cidades inteligentes, dentre outros.