Uma parceria para além da exportação de bens
Divulgadas no início de novembro, as Propostas do Comitê Central do Partido Comunista da China (que funcionam como uma espécie de esboço para o plano) – sobre a formulação do 14º Plano Quinquenal de Desenvolvimento Econômico e Social Nacional e Metas de Longo Prazo para 2035, reforçam o grande enfoque dado ao desenvolvimento de uma matriz energética mais verde.
Há uma década, a China mantém a posição de maior parceiro comercial e principal destino das exportações do Brasil. No entanto, isso ainda é pouco, pois há muitas áreas onde a cooperação entre Brasil e China pode alcançar um novo patamar de desenvolvimento. O setor de energia limpa é uma delas, com amplas possibilidades de aumento de investimentos, geração de emprego e de renda, em ambos os países.
Atualmente, quando se fala de matriz verde, o Brasil é um modelo superior a ser seguido - um paragon ou bangyang (榜样). Possui uma das matrizes energéticas mais renováveis do mundo, composta por 46% de renováveis contra 14% do resto do mundo, de acordo com a Agência Internacional de Energia. O Brasil foi pioneiro mundialmente no desenvolvimento de um amplo programa de combustíveis renováveis, no âmbito do exitoso Programa Proálcool, ainda nos anos 1970. Dessa forma, o objetivo chinês, declarado nas propostas do Comitê Central do Partido Comunista, de implementar uma abertura de alto nível para o exterior e abrir novas perspectivas de cooperação ganha-ganha vem totalmente ao encontro dos interesses brasileiros.
Nesse sentido, o Brasil tem em curso duas iniciativas regulatórias importantes, a saber, o RenovaBio[1] e o Novo mercado de Gás, que pretendem atrair grande volume de investimentos para os setores de biocombustíveis e gás natural, respectivamente. Tratando agora de um setor mais maduro, mas nem por isso menos sedento por investimentos, temos a geração elétrica no Brasil, onde - de acordo com dados da Empresa de Pesquisa Energética Brasileira - mais de 65% da capacidade de geração é de origem hidráulica. Nessa seara, cabe destacar as inúmeras possibilidades de cooperação com a gigante de energia chinesa, State Grid. Como o maior serviço público do mundo, de acordo com dados do Conselho Empresarial Brasil China (CEBC)[2], e com uma receita total registrada em 2018 de US$ 363,1 bilhões, ficou em 2º lugar na Fortune Global 500 de 2016 a 2018. Ainda de acordo com o CEBC, a State Grid possui duas plataformas no Brasil, SGBH e CPFL e ativos totais de cerca de R$ 26 bilhões, 15.700 km de linhas de transmissão. Outra empresa presente por aqui desde 2013, mas menos conhecida, é a China Three Gorges Corporation. O grupo atua em energia limpa, com foco em hidrelétricas de larga escala e já é a segunda maior empresa privada de geração de energia elétrica do país, de acordo com dados do CEBC.
Promover o uso de energia limpa, com baixo teor de carbono, de forma segura e eficiente é uma prioridade para a China. Ela pretende promover uma verdadeira revolução energética, melhorando a produção de energia, sistemas de abastecimento e armazenamento, fortalecimento das garantias jurídicas, dos sistemas de financiamento, de inovação e tecnológicos, para a promoção de indústrias de proteção ambiental em setores-chave da economia.
Faz todo o sentido expandir a exitosa parceria entre Brasil e China no comércio exterior para outras áreas do conhecimento, em especial àquelas com maior teor tecnológico e valor agregado. A China, comparada aos principais países desenvolvidos, tem um histórico de ser muito mais flexível com a imposição de condicionalidades e ser mais aberta a acordos que possibilitem transferência de conhecimento. Não se trata, de forma alguma, de conferir qualquer tipo de preferência ou prioridade à China, mas simplesmente deixá-la sentar-se à mesa de negociação. Quanto mais players no mercado brasileiro, melhor. E, como deve ser em qualquer país capitalista, que vença a melhor proposta.
Escrito por Luís Adolfo Pereira Beckstein, consultor em investimentos estrangeiros e especialista em análise econômica.
[1] O RenovaBio é a nova Política Nacional de Biocombustíveis, instituída em 2017, cujo objetivo é expandir a produção de biocombustíveis no Brasil, uma nova política nacional de biocombustíveis, que inclui submetas para as distribuidoras de combustível aumentarem a oferta de biocombustíveis.
[2] Oportunidades para o Brasil de Uma Parceria Estratégica com A China. Relatório da Conferência Anual do CEBC.