A situação das relações comerciais China-Brasil em 2020 e perspectivas de cooperações no futuro
Por José Nelson Bessa Maia
Antecedentes
As relações diplomáticas entre Brasil e China começaram em 1974, mas o intercâmbio comercial somente ganhou dinamismo após a entrada da China na OMC. Em 1993, os dois países firmaram uma "parceria estratégica" e, em 2004, criaram uma instância de alto nível de diálogo e cooperação cuja reunião mais recente ocorreu em Pequim em maio de 2020.
Devido ao seu peso na região, o Brasil lidera nos fluxos de comércio chinês na América Latina. Desde 2009, a China é o principal parceiro do Brasil na exportação.[1] A corrente de comércio Brasil-China ampliou-se de forma marcante entre 2000 e 2019 – passando de meros US$ 2,3 bilhões para US$ 98,6 bilhões, 42 vezes mais, chegando a US$ 102,2 bilhões nos últimos 12 meses, terminados em novembro de 2020. Desde 2012, a China tornou-se, também, o principal fornecedor de produtos importados pelo Brasil.
O Impacto da Pandemia de Covid-19
Para prevenir a propagação da pandemia de COVID-19, países em todo o mundo tomaram ao longo de 2020 uma série de medidas restritivas, que afetaram negativamente o comércio internacional de bens e serviços. Segundo a Unctad, o comércio internacional deverá declinar em 20% em 2020.[2] Dentre as economias do G-20, o Brasil expandiu suas exportações em 1,7% no 3º trimestre de 2020 após uma queda de -7,4% no 2º trimestre.[3]
Como a China é o principal comprador de soja e proteína animal do Brasil, a demanda chinesa ajudou a minimizar os efeitos da recessão econômica. O comércio exterior está, assim, contribuindo para aquecer a economia brasileira e estimulando a recuperação industrial. As exportações estão sendo um motor para a retomada do crescimento econômico.
A Recuperação Chinesa e a Expansão do Comércio com o Brasil
Conforme dados da Secretaria de Comércio Exterior (SECEX) do Ministério da Economia do Brasil, no período janeiro-novembro de 2020, as exportações brasileiras tiveram queda de -7,4%, bem abaixo de muitos países do G-20. Esse resultado deveu-se, sobretudo, ao aumento das exportações para a China, que apresentou incremento de 9,4% no mesmo período, acumulando um valor exportado de US$ 63,1 bilhões. Com isso, a China passou a responder por 32,8% do total das exportações brasileiras (contra 28,1% em igual período de 2019).[4]
Enquanto isso, as exportações para os EUA (o segundo maior parceiro comercial) despencaram em -29,8%, reduzindo a participação americana para 10,3% do total. Isso significa que a recuperação da economia chinesa ajudou o Brasil a enfrentar o colapso do comércio internacional neste ano de pandemia, contribuindo para manter a renda e o emprego nos setores do agronegócio e da mineração (que foram menos afetados pela crise), mantendo o superávit na balança comercial do país e evitando assim a emergência de uma crise cambial.
China-Brasil: parceiros estratégicos e potencial da cooperação
Apesar de pressões de grupos direitistas no Brasil contra a China, as boas relações com o país asiático são estratégicas para a economia brasileira. Os setores empresariais do agronegócio e da mineração são um contraponto aos grupos mais radicais e irão atuar para refrear as ações dessa ala ideológica sobre o governo. Além disso, a derrota do populismo de Donald Trump nas recentes eleições americanas e a posse do governo Biden/Harris certamente reduzirá a polarização entre China-EUA que alimentava o discurso dessa ala extremista no Brasil.
Como já ocorreu no passado, o pragmatismo responsável prevalecerá. De fato, cabe lembrar que foi na época do governo militar e ainda durante a Guerra Fria que o então presidente Ernesto Geisel (1974-1979) reatou relações diplomáticas com a República Popular da China. O então chanceler o convenceu de que era o mais sensato a fazer e que nada tinha a ver com simpatia pelo regime político chinês. Desta vez, o mesmo deverá acontecer!
José Nelson Bessa Maia é economista, mestre em Economia Internacional e doutor em Relações Internacionais. Pesquisador das relações sino-brasileiras.
[1] Cf. Arbache, J ; Maia, J.N.B. O future da China e as oportunidades para o Brasil. Conselho Empresarial Brasil-China, 2019, disponível em: < https://cebc.org.br/2020/09/28/o-futuro-da-china-e-as-oportunidades-para-o-brasil-2/>.
[2] United Nations, The collapse of global trade and implications for developing regions, September 2020, disponível em <https://www.un.org/development/desa/dpad/publication/world-economic-situation-and-prospects-september-2020-briefing-no-141/>.
[3]
Cf. OECD, G20 international merchandise trade rebounds in Q3 of 2020 but remains below pre-pandemic level. 26 November 2020, disponível em: < https://www.oecd.org/sdd/its/International-trade-statistics-Q3-2020.pdf >.
[4] Cf. SECEX, disponível em: http://www.mdic.gov.br/index.php/comercio-exterior/estatisticas-de-comercio-exterior/comex-vis.