Diego Pautasso: China tem papel estabilizador no reordenamento de poder mundial
O conflito ocorrido na Ucrânia provoca a nova queda-de-braço entre a Rússia e os Estados Unidos em torno de um processo sempre interrompido que poderia integrar a Europa com a Rússia e até com toda a Eurásia, reconfigurando assim o poder internacional, disse o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Diego Pautasso, ao analisar essa grande tensão da atualidade.
Já a Iniciativa Cinturão e Rota, vista como uma globalização chinesa, também envolve a integração de infraestrutura na Eurásia, por isso, “a China se torna, de certa forma, um ator protagonista na disputa pelo reordenamento internacional”, apontou o especialista gaúcho. Destacou, porém, que o país oriental é um elemento estabilizador, observando que os projetos chineses no exterior possuem um mecanismo de ganho compartilhado, promovem o desenvolvimento social, não desestabilizam o governo local nem impõem uma agenda liberal, assim como fazia o Fundo Monetário Internacional na década 90 sob liderança dos EUA.
Autor do livro “China e Rússia no Pós-Guerra Fria”, Pautasso vê a China como uma força global irrefreável. No entanto, a mentalidade de Washington e seus aliados de não ter espaço para compartilhamento de poder faz com que eles passem a mobilizar todos os meios de intervenção militar, sanções e outros mecanismos para interditar a ascensão de uma nova potência desafiante. No caso da China, tanto a guerra comercial quanto a questão de Hong Kong, da separação de Taiwan e da disputa no Mar do Sul da China fazem parte da estratégia da Casa Branca de tentar fragmentar o país oriental.
Quanto à postura da China, Pautasso percebeu que “o país tem sido mais assertivo nesses temas sensíveis em função da atual capacidade e não permitirá que os norte-americanos lhe arrastem para o conflito”. Ele avaliou que é importante impor limites aos Estados Unidos.
Baseado no estudo sobre a China feito durante 17 anos, Diego Pautasso enxerga que a China tem sido um firme defensor do multilateralismo e mantido seu vínculo profundo às organizações internacionais e ao Direito Internacional. Ele enfatizou a visão chinesa de que o desenvolvimento deve ser compartilhado a fim de alcançar a sustentabilidade, caso contrário serão produzidos ciclos permanentes de instabilidade. “A capacidade de pensar a longo prazo pode ser uma contribuição chinesa”, concluiu Pautasso. Ele sugeriu que as pessoas se dispam desse olhar etnocêntrico acerca das civilizações do Oriente para entender melhor o nosso mundo em transformação.
Na entrevista, Diego Pautasso traz também uma interpretação perspicaz sobre o funcionamento democrático do país socialista com seu ensaio “China e Democracia: convite a ir além da ideologia”. Confira!