David Magalhães destaca atitude responsável da China pela defesa da ordem multilateral
A cúpula do G20, organizada pela Arábia Saudita, terminou no último domingo (22) com abordagem de temas como o enfrentamento coordenado da pandemia, a recuperação econômica mundial e o compromisso ambiental, entre outros. Na avaliação do professor de Relações Internacionais da PUC São Paulo, David Magalhães, o consenso mais importante e prático na pauta reside na suspensão do pagamento de juros da dívida aos países vulneráveis nessa crise sanitária, até mais aguda do que a crise financeira de 2008.
Apesar de não ver um sinal explícito da reanimação do multilateralismo devido à ausência dos Estados Unidos, David Magalhães destacou a atitude responsável da China pela defesa do atual sistema de governança internacional. “Isso está muito claro nas posições adotadas pelo presidente chinês, Xi Jinping, durante o G20 e o Brics,” observou. O professor cita as falas do líder chinês a respeito do reforço da importância da Organização Mundial da Saúde no combate a Covid-19, apelo pela implementação plena do Acordo de Paris e a oposição ao protecionismo.
Ao contrário de muitas previsões catastróficas no começo do século 21, de que a ascensão chinesa ia destruir a arquitetura multilateral, a China assume um papel em prol do bom funcionamento dos mecanismos globais, viu o professor. Ele concordou com a demanda dos países emergentes por uma reforma nas instituições internacionais, dado que a atual estrutura já não representa a realidade. “Nota que a China tem se mantido nessa ordem criada pelos próprios países ocidentais. Só quer reformar os órgãos como qualquer ator nesse sistema”, sublinhou Magalhães.
Na observação do especialista brasileiro, muita desconfiança sobre a China, especificamente no caso da pandemia de Covid-19, partiu da posição dos Estados Unidos com uma ideologia fortemente sinofóbica, e que foi distribuída para o Brasil. Já o ambiente virtual, que é difícil fazer checagem no momento, piorou mais essa atmosfera antiChina.
Como estudioso de relações internacionais, David Magalhães salientou que a China tem sustentado políticas externas muito claras e consistentes. Classificou a iniciativa Cinturão e Rota como um projeto gigante de integração de infraestrutura em busca de influência na sua região, mas enxergou que a postura da China é mais colaborativa do que dominação global. “Afinal de contas, nenhum país consegue exercer uma dominação global, nem os Estados Unidos nos anos 90”, resumiu. Além disso, sugeriu que a China tem que saber lidar com as críticas sempre reservadas na mesa dos políticos ocidentais, inclusive direitos humanos e democracia. Para ele, “é interessante ver como esses valores são instrumentalizados politicamente. ”
Quanto às relações entre o Brasil e a China, David Magalhães acentuou que o Planalto e o Itamaraty devem recuperar a tradição histórica da diplomacia brasileira, em vez de deixar a ideologia atrapalhar o entendimento dos fatos. Ele salientou que desde 1974 o relacionamento com a China já era muito valorizado e mantido até último governo, porque todos os líderes sabiam a importância da parceria com a China. Magalhães espera que no ano que vem o Brasil tenha uma política externa mais pragmática e realista.