ONU fortalecida, uma necessidade
Por Pedro Luiz Rodrigues
Com o final da Guerra Fria, a bipolaridade que marcou a ordem internacional desde meados do século passado, cedeu vez a uma breve etapa unipolar (dos Estados Unidos), à que se seguiu uma outra - a que hoje vivemos-, de um mundo cada vez mais multipolar.
Essa multipolaridade vem ganhando corpo desde o início do milênio - com a ascensão da China, o fortalecimento da Europa e, em escala variável, de países como o Brasil, a Rússia, a Índia, a África do Sul e a Indonésia-, trazendo consigo novos desafios de governança global.
O principal desses desafios é o da instituição de uma nova ordem multipolar que seja baseada em parcerias, ao invés de rivalidades; onde o diálogo e a diplomacia substituam o confronto e o espírito bélico. Para se fazer uma transição bem-sucedida, organizada e pacífica para esse novo mundo multipolar, precisamos contar com um sistema multilateral eficaz.
Diferentemente do que temos observado recentemente, o momento é o de se fortalecer a Organização das Nações Unidas (ONU) e suas agências. A entidade não apenas dá sinais de que é abalável, mas de que pode entrar em colapso, caso perdurem as investidas que vem sofrendo.
Criada há 75 anos, após a mais sangrenta guerra da História, a ONU atendia as aspirações de se criar um governo global, que pusesse fim aos conflitos e melhorasse a governança nas relações internacionais, objetivos que sua antecessora – a Liga das Nações – mostrou-se incapaz de alcançar.
Uma ONU fortalecida dependerá, obviamente, da disposição de seus integrantes de prestigiá-la. Aperfeiçoamentos em suas regras e mecanismos serão sempre bem-vindos. Como no passado disse o ex-secretário-geral Dag Hammarskjöld, talvez a ONU não possa levar a humanidade ao Paraíso, mas certamente poderá salvá-la do Inferno.
O atual secretário-geral António Guterres já definiu a atual fase como “ainda não multipolar, mas essencialmente caótica”, e fez referência aos cinco desafios que perduram no cenário: rupturas geopolíticas, agressão ambiental, desconfiança da globalização, o lado tenebroso da tecnologia digital e a pandemia.
Nenhum desses pode ser resolvido sem coordenação multilateral. Se há sócio da ONU que queira dar passo atrás, todos os demais devem dar passos à frente.
(Pedro Luiz Rodrigues é jornalista e diplomata aposentado. Foi Embaixador do Brasil na Nigéria e serviu nos EUA, Bangladesh, Argentina, Paraguai, Israel e França. Foi diretor do jornal O Estado de São Paulo em Brasília e Secretário de Imprensa da Presidência da República e do Ministério das Relações Exteriores.)