Do Extraordinário ao Ordinário: uma história sobre o KFC na China

Published: 2018-12-18 17:03:01
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Quando alguns dos meus antigos colegas da universidade vieram a Beijing na semana passada, a gente planejou fazer a mesma coisa que costumávamos fazer quando nos reuníamos no passado: encontrar um restaurante, talvez um pouco chique, onde pudéssemos conversar livremente.

Qianmen, que significa "Torre Frontal", é uma famosa avenida de Beijing parecida com a Champs-Elysees, em Paris. Ela situa-se ao sul da Praça Tiananmen, um bairro repleto de estabelecimentos culturais e comerciais. Depois de estacionar o carro nas proximidades do bairro em uma fria noite de dezembro, fomos dar um passeio para localizar a loja que visitamos há 30 anos. Ela é semelhante a todas as outras da cadeia KFC, exceto as tábuas de madeira de três metros de altura na fachada, onde estão escrito "12 DE NOVEMBRO DE 1987. A PRIMEIRA LOJA DA CHINA", em inglês e chinês.

Este foi realmente o grande destino a que chegamos há tantos anos? Todos nós tivemos nossas dúvidas, inclusive eu, e moro em Beijing desde que a loja foi inaugurada. Mas um servidor atrás do balcão nos garantiu que a loja não tinha mudado. Percebemos que não era tão fácil reconhecê-la porque muitos novos prédios surgiram em torno dela e o segundo e terceiro andares viraram um restaurante Pizza Hut e um hotel.

A inauguração da loja, uma joint venture de mais de 30 anos, foi manchete na China, até que o próprio embaixador dos EUA e altos funcionários de Beijing compareceram à cerimônia de abertura. Foram tantos clientes que queriam entrar na loja que a polícia teve que ajudar a manter as filas de espera em ordem. As pessoas ficaram por quase duas horas para ter a oportunidade de experimentar o fast-food americano.

O KFC estava longe de ser acessível para a maioria das pessoas na China daquela época. Um pedaço de frango custava dois yuans e 50 centavos, sendo realmente uma coisa luxuosa, já que o nível médio de um funcionário governamental era de cerca de 100 yuans por mês. No entanto, as pessoas correram para o restaurante KFC, considerado um símbolo do estilo de vida ocidental, de modo a aprender algo sobre o Ocidente moderno e avançado. Por muitos anos, jantar nos restaurantes das cadeias de fast-food estrangeiras era uma moda para os chineses. Algumas pessoas até se casaram no terceiro andar da loja de Qianmen, porque era um local que poderia lhes render muita exibição.

Foi apenas alguns meses após a inauguração da loja de Qianmen que meu professor norte-americano convidou todos os 18 alunos da nossa turma para ir lá conhecer a "cultura americana". Nós explodimos em uma salva de palmas ao ouvir a notícia. Eu nunca tinha pensado seriamente em ir lá sozinho, porque uma refeição teria me custado quatro dias do meu orçamento alimentar.

Quando nos sentamos na loja comendo o nosso frango no mesmo lugar 30 anos depois, tivemos uma recordação vívida sobre aquela primeira visita. Lembramo-nos da longa fila de mais de uma hora. Yin, minha colega vinda de Guangzhou, que agora é uma executiva de relações públicas de uma empresa automobilística chinesa, gostou tanto do frango frito que usou seu pão para pegar todos os minúsculos restos de massa crocante no fundo da caixa de papel. Também comi tudo: frango, purê de batata, pão e a salada de couve, apesar de ser um pouco doce demais para o meu gosto.

Nossa colega Guan, que agora é professora em uma universidade em Chicago, lembrou-se de quando o seu pai a visitou Beijing e lhe ofereceu um jantar no restaurante KFC. Ele lhe pediu uma refeição, mas nada para si, inventando desculpas que ele já havia comido.

Nós tínhamos conversado por tanto tempo que ninguém percebeu que já eram quase onze da noite. Eu olhei ao redor da loja silenciosa. Dois adolescentes em outra mesa compartilhavam um conjunto de fones de ouvido para ouvir algo no celular. Acima deles havia um cartaz anunciando que, no ano de 2010, o KFC tinha três mil pontos de venda na China. Agora, a cadeia conta com mais de 5.300 lojas em mais de mil cidades e vilas.

Apesar de seu sucesso na abertura de novas lojas, a cadeia perdeu, ao longo dos anos, seu brilho como um destino de luxo. Agora, está parecida com muitos outros restaurantes no bairro que oferecem fast-food barato, um lugar tranquilo onde os alunos podem se sentar e estudar e um lugar onde as pessoas entram para usar o banheiro.

Uma simples refeição no KFC custou a um trabalhador comum quatro dias de salário, mas agora é apenas um sétimo de seu salário diário. À medida que os chineses se tornaram ricos, não estão mais satisfeitos com o simples prazer do frango frito. Uma curta caminhada pela rua principal em Qianmen levará você a restaurantes italianos, alemães, espanhóis, mexicanos e japoneses, sem mencionar os estabelecimentos que oferecem especialidades chinesas como hotpot e pato de Beijing.

Como a comida ocupa apenas uma pequena parte dos gastos chineses, especialmente dos moradores urbanos, as pessoas têm uma maior diversidade de gastar o dinheiro, como comprar uma casa ou um carro, sair para as férias ao exterior ou mandar seus filhos para estudar em países estrangeiros.

O frango frito pode ser o mesmo, mas nossas escolhas e gostos mudaram.

Por Li Peichun

Nota: Li Peichun é o editor sênior do Serviço de Inglês da Rádio International da China.


Tradução: Laura

Revisão: Diego

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